Manuel António Gouveia

Do alto dos oitenta e tal anos A saúde

Com oitenta e tal anos, ou perto desta idade, já se viveu muito tempo e, como penso, todos tiveram os seus problemas de saúde.
Enumerar as doenças que, nesta idade, fizeram sofrer quem as viveu, seria um disparate completo. Por isso, aleatoriamente, posso citar apenas algumas que considero muito incapacitantes: tuberculose, cancro, alzheimer, demência, ciática, úlcera e traumatismos vários.


Falando de Incêndios

Parece que tinha de acontecer. E mesmo parecendo que tinha de acontecer, de facto, aconteceu. Os incêndios, neste país, amplamente divulgados e penosamente suportados, atraíram telespetadores, radio-ouvintes e leitores. Provocaram mortos e feridos, lamentações, perdas, movimentações, exclamações, desânimo, discussões, e comentários, durante mais do que o fim-de-semana recentemente passado. Hoje, 22 de setembro de 2024, ainda fere a nossa vista tudo quanto nos mostraram, tudo quanto lemos, bem como os nossos ouvidos ainda sofrem por tudo quanto ouvimos.


A escola ideal

Aquela professora costumava contar ou ler aos alunos pequenos contos, alguns dos quais eram comentados e outros dramatizados. Um dia, como não lhes apetecia brincar no recreio, os colegas Manuel e Maria conversavam animadamente sobre qual seria, para o Manuel, a escola ideal. Este hesitou um pouco, mas, por fim, decidiu contar o sonho que teve, há dias, sobre o que ele considerou ser a escola ideal.


Emigração

Por todos sabido, é extensa a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – tão grande que está espalhada pelos cinco continentes. Foi neles que os nossos emigrantes encontraram a melhor forma de vida, contrariamente às graves dificuldades que sentiram para conseguirem uma digna sobrevivência no seu país. E é esta Comunidade que levou e continua a levar a todos os cantos da Terra o conhecimento, a cultura, os costumes e os hábitos de Portugal.


A falta de professores

om o objetivo de tentar solucionar ou minimizar a falta de professores da escola pública para que os alunos beneficiem do seu inquestionável direito a todas as aulas constantes dos respetivos programas, entre algumas medidas propostas pelo Governo, sobressai uma com estas duas componentes: recorrer a professores aposentados; e a horas extraordinárias dos que estão ainda no ativo. Parece fácil; mas, não querendo duvidar desta solução, entendo que será muito difícil pô-la em prática.


O 25 de abril

Não se compreende falar do mês de abril sem referir o “25 de Abril”, dia da Revolução de 1974, em Portugal, que nos permitiu transitar duma situação de ditadura para uma de democracia.
Muitos de nós vivemos a ditadura, na qual a censura nos era grandemente imposta, assim como escamoteada muita informação, enquanto, no dia a dia, ambicionávamos a liberdade de expor as nossas ideias, bem como a sua concretização.


A minha ferida muito má

Quando o médico me disse
– E outros médicos confirmaram –
Que eu tinha uma ferida muito má,
Estava bem longe de supor que o abatimento em que vivia
Resultava apenas dessa ferida que me atormentava,
Dia a dia.
Porém, tanta felicidade me envolveu
Que, numa operação bem-sucedida,
Me foi retirada essa má ferida.

Agora sinto-me bem
E só peço que a ninguém
Aconteça o mal que eu tive.


Ser político

Ser político
(Adaptado do original)

Eu não posso ser político.
Se eu fosse político, como poderia afirmar,
Aos microfones e perante as câmaras,
Por exemplo, assim:

“- Cidadãos! O meu Governo é o melhor de todos”,

Se, no meu país, deixar que haja crianças a morrer sem nome,
Velhinhos a sofrer a solidão e a fome,
Barracas a cair de velhas, buracos a crescer de velhos,
Lágrimas de revolta e o consentir
Como se pode assim mentir?


Poema no Dia da Mulher (2)

Mulher, repara! Fez-se noite, de repente!
E a noite, maldosamente,
Aproveitou para esconder o mal que te feriu no peito!
E porque a noite é de breu, não há forma – não há jeito
– Penso eu – de encontrar aquele mal que te fez chorar
E que – diabólico – em situação tão insólita,
Naquele momento,
Desapareceu com o vento!


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