O caminho do regresso à barbárie: 2. A nova barbárie e a sua gestão pelo neoliberalismo
No último artigo (Mensageiro, 14-07, O caminho do regresso à barbárie: 1. A Desconstrução do Estado de Direito Democrático e Social), propusemo-nos reflectir sobre os apelos à desregulação do Estado e da Sociedade pelos arautos do neoliberalismo, a fim de instalarem um Estado Mínimo e quase anómico (sem Lei), para que o livre jogo do mercado e da concorrência permita o triunfo dos mais fortes (os mais ricos, os mais cultos e os mais próximos do poder, na definição de Max Weber ou ainda do conjunto destes e dos mais aventureiros, na definição de Friederich Nietzsche e de Joseph Shumpeter), e a instituição de novas regras políticas e sociais, baseadas nestas qualidades e na auto-regulação do mercado.
Na prática, estas novas regras conduziram, para já, e continuarão a conduzir, à nova barbárie, expressa na precarização do emprego e desemprego em massa, na desvalorização das qualificações escolares, na destruição das condições de estabilidade para o estabelecimento de laços familiares, na desvalorização dos factores de identidade cultural e social como a religião e os valores nacionais, na não existência de um local de trabalho porque podem ser todos, no mundo, na veiculação de uma ideologia de liberdade de realização pessoal fora de qualquer quadro regulador, a qual só despersonaliza os indivíduos e os torna extremamente frágeis às manipulações ideológicas e culturais.
Paradoxalmente, esta nova ideologia da liberdade produziu os maiores aprisionamentos do pensamento e da criatividade. O que vemos hoje são hordas de jovens e de pessoas, levados em grupos para discotecas, centros comerciais e outros lugares, sem saberem sequer ao que vão. Vão para onde as manipulações das televisões e das redes sociais os levam, sem outras motivações que não sejam a vontade inconsciente de matar a solidão interior e de pertencer a um grupo. As pessoas vivem na maior solidão.
Por que aconteceu tudo isto? Aconteceu por uma integração dialéctica dos movimentos económicos, culturais e políticos dos Séculos XIX e XX, em que as novas ideologias integraram os elementos das anteriores pelo menos para se legitimarem no plano da propaganda. Por exemplo, o neoliberalismo, mais difundido a partir de meados da década de 70 do Século XX, reclamou para si, no plano social, todos os direitos das mulheres, das minorias, todos os direitos dos cidadãos, até mesmo ideais de discriminação positiva das sociedades sociais-democratas, da igualdade social e do multiculturalismo.
Porém, na prática, o que prevaleceu foi a concorrência económica, o assalto aos financiamentos do Estado por parte dos grupos económicos mais poderosos, reclamando mais privatizações, menos impostos e condições de trabalho mais flexíveis em torno dos direitos dos trabalhadores, produzindo e consolidando a nova barbárie.
Até onde nos levará esta nova barbárie? Certamente à tragédia social, até que um novo contrário se apresente na lógica dialéctica histórica como alternativa e como oposição. De momento, os cidadãos estão sós, vítimas de um único poder. Pode ser um período trágico na história mundial.