Entrevista a Fátima Bento - CDU

“Não se foi mais longe por falta de vontade do PS e com o aval do PSD e do CDS”

Publicado por António G. Rodrigues em Sex, 2019-10-04 14:31

Mensageiro de Bragança: Porque aceitou ser candidata da CDU pelo distrito?

Fátima Bento: Houve uma discussão do coletivo CDU para organizar a lista e foi-me proposto ser cabeça de lista. Para mim é um desafio importante porque não só me revejo na política que a CDU defende como acho que a política que nos trouxe até aqui, às dificuldades que temos na região, nunca será a solução para os problemas que temos. E as políticas da CDU apresentam soluções concretas.

 

MDB.: Não tem sido muito comum, nos últimos anos, a CDU escolher pessoas da região para cabeça de lista…

FB.: Tem havido um grande esforço de renovação de quadros e de dar oportunidade a novos militantes. Estando integrada e na Assembleia Municipal de Bragança, foi-me dada a oportunidade, não só por ser daqui, mas por ter algum trabalho feito.

Morei alguns anos no Porto mas achei que não reunia as condições que eu precisava para viver. Sempre fui defensora da nossa região e só estando aqui a podemos defender de forma objetiva. Foi com esse objetivo que voltei para Trás-os-Montes e me deparei com uma realidade que pensava já não existir. Não só o despovoamento mas todo um conjunto de serviços que deixaram de existir.

 

 MDB.: Em relação a esta legislatura, foram quatro anos em que as políticas governamentais tiveram um forte apoio da CDU. Que balanço faz?

FB.: Dizemos recorrentemente que não se foi mais longe por falta de vontade do PS e com o aval do PSD e do CDS. Para a região foi fundamental não só o aumento do salário mínimo nacional como a questão do abono de família, dos livros escolares. Ou seja, medidas que são de nível nacional mas que veio melhorar as condições de vida das populações do Interior, onde os salários são mais baixos.

Também conseguimos implementar a extinção do pagamento especial por conta, que veio promover algum desenvolvimento económico. O nosso papel foi fundamentalmente na reposição de direitos, que já tínhamos perdido e de outros novos que vieram melhorar as condições de vida da população.

E quando estiveram em causa direitos dos trabalhadores e do povo, como na questão do código de trabalho, fomos contra.

Apesar de ter havido um entendimento para melhorar as condições de vida das pessoas, a CDU esteve lá. Mas sempre que não foram de acordo com essa melhoria, estivemos contra e fizemos tudo o que era possível para reverter essas posições.

 

MDB.: Posto isto, em que estado está o distrito? O que precisa a região?

FB.: Em 45 anos de pós-25 de Abril, nunca tivemos nenhum eleito da CDU pelo distrito. Mas o PCP e o PEV sempre fizeram um trabalho de acompanhamento da região. Não só temos a visita de inúmeros deputados da Assembleia da República como lhes fazemos chegar os problemas que aqui temos. Claro que a força que temos é limitada por isso. O diagnóstico está feito há muitos anos. Claro que a força que temos é limitada por não termos aqui nenhum eleito. O diagnóstico está feito há muitos anos. O problema é que as medidas para alterar este paradigma não são concretizadas. Não tem havido vontade política do PS, do PSD e do CDS para reverter a situação.

A regionalização nunca foi efetivada. Podemos falar do investimento público em escolas, na educação, na saúde, nos transportes, que continua por concretizar.

 

MDB.: Uma das coisas para as quais a CDU vai chamando a atenção é o encerramento de serviços na região. Tendo em conta que houve esse acordo que permitiu a governação do PS, considera que a CDU poderia ter sido mais reivindicativa aqui para a região?

FB.: Nós tivemos esse papel. Quando foi a discussão do Plano Nacional de Investimentos reivindicámos sempre um conjunto de investimentos que poderiam desenvolver a região e que não foram incluídos.

 

MDB.: Em que áreas considera fundamental intervir?

FB.: Continuamos a bater-nos pela ferrovia, pela saúde, não só na questão dos equipamentos médicos mas na contratação de mais trabalhadores. A proposta que temos de passar a haver uma rede de creches para crianças até aos três anos, o alargamento do ensino pré-escolar… todo um conjunto de investimentos que têm de ser obrigatoriamente públicos.

 

MDB.: Recentemente houve uma bolsa de contratação de médicos para a região, que ficou a meio preenchimento. Ou seja, os médicos é que não quiseram ser contratados. Como se resolve isto? É preciso aumentar as propostas a estes trabalhadores?

FB.:   Já tivemos uma proposta na Assembleia da República no sentido de dar condições especiais para a fixação destes médicos. O problema é muito mais de fundo, de os hospitais não terem as condições que eles precisam, de estarem longe dos centros de investigação. Os próprios equipamentos disponíveis não serem os que pretendem e a região não ter as condições de vida que terão numa grande cidade.

É importante haver medidas específicas que atraia esses médicos, tal como a que propusemos. Mas isso resolve-se com mais qualidade de vida para a região. Temos as paisagens e o ambiente mas é preciso tudo o resto, serviços públicos, transportes… o desenvolvimento da região.

 

MDB.: Ao nível de serviços públicos, quais acha que deveriam ser as apostas no Nordeste Transmontano?

FB.: Voltamos à velha questão da saúde, da falta de valências que temos. Falamos na educação, que tem uma carência muito grande nas creches e no pré-escolar; nos transportes públicos e na mobilidade inter-concelhia; em alguma estradas que estão muito degradadas e falamos sempre na ferrovia como instrumento fundamental para a promoção do ambiente.

 

MDB.: Concretamente, o que propõe a CDU para o distrito de Bragança para os próximos quatro anos?

FB.: A regionalização como primeiro instrumento, que certamente não resolverá todos os problemas mas que aglomerará um conjunto de medidas que permitirão o desenvolvimento; a reposição das freguesias sempre que o queiram; a reversão de privatizações como a dos CTT; o que está em curso da água tem de ser travado; a questão da mobilidade, que haja um reforço do financiamento para que haja um reforço de transportes públicos. E um conjunto de medidas a nível nacional que vão ter aqui repercussão, como o aumento do salário mínimo nacional, que é fundamental para uma região que tem os salários médios mais baixos do país. Isto sem esquecer o apoio às Pequenas e Médias Empresas, com uma justa tributação que lhes permita competir com as maiores. Fundamental é, também, a efetivação do estatuto da agricultura familiar para desenvolver as potencialidades que aqui temos.

 

MDB.: De que forma isso poderia ajudar?

FB.: Esse estatuto teve a nossa intervenção direta e é fundamental para reconhecer a agricultura familiar, que é o que a nossa região tem. Não só lhe dá mecanismos para se desenvolver como permite o desenvolvimento de um conjunto de explorações agrícolas que, com as políticas da União Europeia, acabaram por desaparecer.

 

MDB.: Estamos numa região de fronteira. O distrito compete não só com as grandes empresas portuguesas mas, também, com Espanha, aonde a fiscalidade é mais baixa. Há forma de resolver isso?

FB.: Em relação ao IVA defendemos duas coisas. Não só a redução da taxa para 21 por cento como o alargamento da de seis por cento a mais bens essenciais. A competição entre países existirá sempre mas uma mais justa politica fiscal permitirá maior concorrência com o país vizinho.

 

MDB.: E a parte da ferrovia?

FB.: Sempre constou do nosso programa. É um meio essencial de transporte que nunca deveria ter sido retirado da nossa região.   

 

MDB.: Aqui em Bragança, há dez anos havia quatro jornais e duas rádios. O Presidente da República já chamou a atenção para a necessidade de abrir o debate. Como vê esta questão?

FB.: Os meios de comunicação social local são a ligação direta das populações à sua realidade. É fundamental que haja financiamento. Depois, depende um pouco. Há jornais e rádios que são cooperativas. O PCP tem uma proposta de essas cooperativas serem tratadas de forma diferenciada ao nível fiscal, beneficiando a sua sustentabilidade. Não podemos permitir que a voz local desapareça.

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