A opinião de ...

Se me é permitido

Perdoar-me-ão puxar pelos poucos galões que tenho, mas sou já um sénior nas andanças da produção, transformação e comercialização de carnes no Nordeste Transmontano: Começarei por enumerá-los: Terminei o curso de Medicina Veterinária em 1981, já na perspectiva de vir a trabalhar no matadouro do Cachão, para onde tinha sido convidado um par de anos antes. A missão era colaborar na construção do Matadouro e nos seus projectos paralelos e estes eram muitos, vinham já de um tempo anterior, onde a organização e modernização da produção eram a prioridade. O nosso território era um todo, mais do que a soma das partes. A organização da produção impunha-se e procurava actualizar-se, em qualidade e quantidade, mas sobretudo organizar a comercialização, para o país e para o estrangeiro. Projectos de suinicultura e ovinicultura (incluindo leite) estavam escritos e estabelecidos. Os seus contornos tecnicamente definidos, a localização das novas unidades encaminhada, os mercados definidos e contactados, o financiamento assegurado. Algumas estruturas físicas estavam praticamente concluídas.
A minha participação foi posterior a isto. Iniciou-se em Janeiro de 1982, data em que entrei ao serviço do CAICA. As obras do Matadouro Industrial II estavam a começar, realizadas por uma empresa de tecnologia francesa (ainda hoje os franceses são líderes desta área de abate e distribuição e a designação internacional para “matadouro” é abattoir, termo francês, utilizado até pelos anglo saxónicos). Aqui tive a oportunidade de “ler” a proposta francesa para o Matadouro Industrial do Cachão: longe dos planos de fomento dos tempos passados, o projecto incluía a redução drástica da capacidade de abate, dada a derrocada dos planos de fomento. Assim, pela mão do Eng. António Meneres Manso, passei vários meses no norte de França, na Bretanha e Normandia, onde a produção animal, indústrias derivadas e comercialização destronaram em poucos anos a supremacia de Paris. O matadouro de La Villete (uma enorme infraestrutura de abate para abastecer Paris e diversas cidades francesas e europeias), já pronto e custando o equivalente hoje a 20 milhões de euros, nunca abriu! Cooperativas da Bretanha e Normandia tomaram nas mãos esse abastecimento.
Na Bretanha e Normandia permaneci por vários meses, estagiando com uma cooperativa francesa – Bocaviande - com cerca de 60 mil agricultores de base. Matadouros, salsicharias, salas de desmancha, produtores, laboratórios de análise sensorial, tudo me foi dado ver em quintuplicado. Visitei inclusivamente o matadouro instalado pelas tropas americanas em 1944, para abastecer as tropas em combate. Visitei os mais modernos matadouros da europa, com cadências de 300 bovinos dia, alguns deles trabalhando somente para exportação.
Meses depois tive ocasião de fazer mesmo no norte de Espanha, com níveis de sofisticação substancialmente diferentes, e salas de desmancha.
Regressado ao Cachão acompanhei a par e passo as obras do matadouro durante dois anos, adaptando à realidade nacional o aprendizado em França e Espanha.
Nessa altura, nos 25 concelhos dos distritos de Vila Real e Bragança havia cerca de 20 matadouros concelhios em estado físico deplorável. Portas com buracos por onde entravam os cães para lamber restos de sangue, um outro cujo telhado tinha caído, nenhum deles com câmara frigorífica, nenhum com tratamento de efluentes, camiões de distribuição ao relento … não deve ser preciso continuar. A minha homenagem às dezenas de funcionários e de médicos veterinários que trabalhavam sem quaisquer condições técnicas de apoio.
Durante esse tempo fiz um levantamento exaustivo de todo o gado bovino, ovino, caprino e suíno existente em Trás-os-Montes, concelho a concelho, a fim de poder calcular qual a quantidade de gado disponível para abate e abastecimento da população, em cada região. Em todo este trabalho procurei e obtive o apoio da Junta Nacional dos Produtos Pecuários, em Lisboa e na sua delegação local, na pessoa do Dr Perdiz Martins, que colaborou em todo este trabalho.
Poucos anos mais tarde, já no IPB onde sou docente, continuei e terminei este trabalho. Publiquei uma tese onde fiz o levantamento de todos os abates em matadouros regionais (evidentemente antes do seu encerramento) ao longo de 25 anos. Nestes anos, em cada matadouro especifiquei, mensalmente, quantos animais de cada espécie eram abatidos e qual o seu grupo etário.
Para além disto, por consulta exaustiva de dezenas de milhares de guias de trânsito de gado, determinei quantas cabeças de gado eram transportadas para o litoral, por espécie, grupo etário e por mês. Finalmente, para que matadouros do litoral era o gado transportado e por quem.
Produção, consumos, concelho a concelho, e volume de gado transportado, permitiram-me ter uma visão única (perdem a imodéstia) do comércio de gado e carne em Trás-os-Montes e da sua mais valia. Utilizando médias de preços das feiras foi-me ainda possível calcular o valor da produção animal em Trás-os-Montes.
Voltando um pouco atrás, logo após terminar as obras do MIC (Matadouro Industrial do Cachão) em 1984 começámos (Cachão e JNPP) a encerrar os matadouros concelhios, numa acção um pouco mais traumática, aqui e ali, mas pacífica.
O matadouro funcionava como prestador de serviços para os retalhistas, que apresentavam as suas reses para abate, recebendo-as no seu estabelecimento 24 h mais tarde, refrigeradas, de acordo com a lei. Era uma prestação de serviços.
O mercado funcionava assim, como hoje, por intermédio de umas dúzias de comerciantes (bem hajam, porque são quem movimenta o mercado) que se abastecem nos seus clientes fidelizados, levam o gado ao matadouro e recebem a carne nos seus talhos. Paralelamente, compram gado aos seus fornecedores fidelizados, transportam-no para o litoral, vendem para grossistas, estes abatem os animais, distribuem por talhos, hipermercados, mercados, restaurantes e talhos. Funciona exactamente como há 50, 60, 70 anos atrás. A única diferença é que estes retalhistas recebem também carne de outras zonas do país e até do estrangeiro, pois as estradas e transportes assim o permitem.
Para terminar esta introdução, longa, há décadas que trabalho com associações e cooperativas, nas suas diversas actividades, uma delas tentando reduzir a distância entre produtores e consumidores.
Pelo que foi dito, creio poder ter uma palavra a dizer.
1 Dispersão - Há décadas que sabemos, e creio que ninguém discordará, que um dos problemas do agricultor é a sua dificuldade em se associar. Devido a ela, a sua produção, pulverizada por cada uma das explorações, por natureza, não atinge quantidades que possam interessar um grande mercado, e um grande comprador fará o preço que entender. Direi mais, este não é só um grande comprador, é alguém que conhece o mercado: se comprar a produção de 10 ou 20 ou 100 agricultores, sabe onde ir vender e, pela quantidade, já tem poder negocial.
Este é o B A (BA) comercial, a coisa mais simples que é possível perceber.

2 Mercado - Quem tem o mercado, tem a produção na mão.
Mas há mais, ainda, para recordar: quem compra a produção de 100 agricultores, pode:
fazer lotes para mercados distintos.
calibrar segundo tamanho, ou outras características.
fornecer os clientes de forma faseada, ao longo do tempo.
comprar, pagar e distribuir de acordo com a qualidade.
conseguir melhores preços do cliente.
informar/exigir aos fornecedores o que pretende.
Em suma, comercializar em moldes actuais, mas só actuais, não modernos ou futuros.

3 Preços - Todos sabemos também a diferença de preços entre o que é pago ao produtor e o que é pedido ao consumidor. Isto deve-se:
Quem comercializa precisa de lucro.
Há uma cadeia de concentração dos produtos.
Quem concentra faz o que diz em 2.
Quem faz o que se diz em 2 precisa de lucro.
Tem de haver uma cadeia de distribuição/dispersão, que precisa de lucro.
Tem de haver uma rede de retalho, que precisa de lucro.
Isto é, cada etapa é um elo que forma uma cadeia que soma diversos lucros.
Em suma, a soma dos elos é a diferença de preço entre o produtor e o consumidor.
4 Ética na produção - Falando agora, mais especificamente, de produção animal, há tendências actuais, com cerca de 30 anos, mas que só agora chegam ao grande público, preocupadas com o ambiente, o bem estar animal, a saúde humana e outras preocupações totalmente legítimas. Na sociedade urbana, em especial, começa a haver representatividade notória destas tendências. Deixemos de lado, para já, o ambiente e a saúde humana, embora sejam cruciais, e vamos focar-nos na produção de animais.
Desde o início da década de 90 que a legislação não pára de aumentar, protegendo o bem estar animal; no fundo apelando a uma consciencialização da natureza, numa ética da exploração de animais para benefício dos humanos. Se bem que a esmagadora maioria da população não é vegetariana, é aceitável que parte maior ou menor da população tenha estas preocupações.
Que eu partilho. Eu e, estou certo, a esmagadora maioria dos produtores!
5 Ética no mercado - Se no mundo urbano, um pouco afastado dos nossos afazeres rurais, há a dúvida sobre a forma como tratamos os nossos animais, entre a população rural essa preocupação não existe, pois:
Um animal bem tratado é o orgulho do criador. Sempre o foi (factor humano).
Numa feira ou concurso fica demonstrado esse zelo (factor humano).
Um animal maltratado produz menos (factor egoísta).
Um animal doente produz menos ou morre (factor egoísta).
Há legislação e fiscalização frequente. (factor repressivo)
Em suma, as coisas não são como alguns escritores ignorantes escrevem. Nem como alguns artigos de jornais nos pintam. É verdade que há casos divergentes, mais do que gostaríamos, mas para isso existem as autoridades. Estas não servem só para regular os bancos, o nepotismo estatal, combater a corrupção, para prender assaltantes, carteiristas, fazedores de fake news ou outras formas não agropecuárias de ofender a lei e o próximo.
6 Contrato social - Apesar de tudo isso, é inteiramente lícito que o consumidor/grande público queira ter essa certeza. E o que temos de fazer é demonstrá-lo. Se é fácil dizê-lo, é menos linear fazê-lo: Como pôr, frente a frente, 10 milhões de consumidores com 100 mil produtores? como responder às suas preocupações? Como conseguir para nós esta transparência?
Isoladamente é impossível!
Porquê? Porque as leis são complexas e extensas e não basta dizer “eu cumpro!” para que essa declaração, e a sua credibilidade, cheguem a 10 milhões de consumidores. E para que todos acreditem.
7 Colaboração - A resposta está no associativismo e no recurso a entidades independentes que, à semelhança do que fazem muitas empresas privadas de outros ramos, certificam os seus serviços. Há empresas privadas, com toda a idoneidade, com supervisão pública, que se dedicam a certificar o cumprimento de normas de excelência ou, pelo menos, legais. Cada um por si não o consegue.
Mas a verdade é que, cada vez mais, os grandes compradores e o consumidor individual procuram evidências desta produção eticamente responsável.
Resumindo, temos então assim que produzir, mas defendendo a ética global da produção: gado e carne, são etapas da nossa cadeia alimentar, como o peixe, mel, ovos, leite ou produtos vegetais (estes últimos têm também a sua ética associada à produção).
Poderá o futuro próximo libertar-nos deles, dos produtos animais? Tenho a certeza que não. Mas isso são outras contas, para abordar noutro fórum.
8 Verticalização - De momento o meu objectivo é demonstrar que a produção animal tem de se verticalizar, isto é, associar ao seu rendimento (produção), o rendimento correspondente à primeira e segunda transformação, transporte e distribuição; quer dizer, concentrar nas suas mãos os vários elos da cadeia.
9 Concentração - Vimos acima que a produção, animal ou vegetal, se caracteriza por uma oferta pulverizada, de qualidade inconstante, não padronizada. Isto é verdade em especial para a produção animal, pois esta é mais difícil de concentrar, já que se trata de animais vivos. Eles precisam de ser guardados, de comer e de beber, reagem uns aos outros e rapidamente entram em stress, logo em perdas. Tudo isto associado às já faladas necessidades éticas. O sacrifício destes animais implica, por maioria de razão, cuidados extra no que à ética diz respeito e, logo de seguida, necessidades de frio e transporte sob refrigeração. A produção animal tem assim uma dificuldade extra relativamente à produção de vegetais, que podem ser armazenados a granel em armazéns sem custos assinaláveis.
10 – Transformação - Mas o gado tem ainda uma dificuldade extra, o custo das indústrias transformadoras, desde o abate até ao final da cadeia. Sempre com cuidados redobrados de frio, higiene, sanidade e prevenção da qualidade. Senão vejamos:
Os custos de carga e deslocação de animais são importantes. Os carros têm de ser homologados, os condutores também. A duração da viagem é sujeita a legislação.
As exigências técnicas de um matadouro são enormes. Ultrapassam de longe qualquer outra indústria alimentar, nesta primeira fase da cadeia. Vejamos o que está aqui em causa:
Desde a descarga dos animais, que já de si não vêm com o melhor humor, em especial animais de grande porte, que são frequentemente agressivos por estar fora do seu habitat, juntam-se, e muito bem, exigências legais relacionadas com o bem estar animal. Espaços amplos, arejados, disponibilidade de água de boa qualidade, ambiente limpo, ausência de barulhos inúteis e várias outras exigências, tornam os estábulos uma construção cara. Mas o verdadeiro custo está na instalação interior. Todas as paredes e chão devem ser impermeabilizados e lisos, permitindo a higienização fácil. Devemos ter em conta que onde se juntam dezenas ou centenas de animais podem progredir doenças infecto contagiosas, ou zoonoses, que é necessário impedir. O bem estar dos animais, já bem basta irem ser sacrificados, deve ser uma prioridade (até por motivos egoístas, da futura qualidade da carne) assim como a segurança dos operários (física e de doenças transmitidas pelos animais). Nesta conformidade, têm de estar instalados equipamentos para desinfecção de mãos e equipamento de corte, dotados de água quente a temperaturas elevadas, para pasteurização. Água de boa qualidade (e gasta-se muita, num matadouro) fria e quente, têm de estar disponíveis, em grandes quantidades. A distribuição de vapor para aquecimento de água de processamento ou lavagem, é também obrigatório. Igualmente imperativa é a disponibilidade de ar comprimido para movimentação de plataformas de trabalho.
A tudo isto acrescente-se equipamento adequado de qualidade inox, em quantidade muito, mesmo muito, significativa, desde equipamento electromecânico, de aquecimento, bombagem, transporte de cargas, etc etc etc. Terminaria com a formação profissional dos operários, para sua defesa e da qualidade sanitária do produto final.
É certamente a indústria alimentar mais cara de construir e a mais cara de manter. A quantidade de resíduos biológicos resultante é de 25 a 40% do total e alguns destes têm de ser transportados a longas distâncias, para incineração.
Acrescente-se ainda a mais complexa necessidade de instalações frigoríficas: para subprodutos, couros, peles, matérias perigosas, miudezas brancas, miudezas vermelhas, câmara para bovinos, para suínos, para pequenos ruminantes, duvidosos, todas independentes. E outras ainda. Os custos de instalação são elevados e os de funcionamento também. Mesmo o simples facto da forma como se aplica o frio pode ser catastrófica, em termos de qualidade organoléptica. Não há qualquer comparação com outras indústrias alimentares. Acrescente-se uma frota de distribuição de carros frigoríficos. Tenhamos ainda a atenção os custos de maturação da carne, muito esquecidos em Portugal: entre o abate e o consumo devem mediar pelo menos 4 dias, o que acrescenta custos de energia na cadeia de frio.
Para tudo isto paga-se uma taxa, de uns poucos euros, tabelada pelo estado.
Antes de terminar recordo que, embora não faça parte dos custos do abate, a desmancha e o corte da carne podem piorar a sua qualidade, se não for feito com as normas técnicas devidas.
Finalmente, e o mais importante, a que parece ninguém dar importância, a única coisa que importa de um ponto de vista económico: Um matadouro nada acrescenta a não ser o abate do animal e a disponibilidade da carcaça. A verdadeira importância, reside na comercialização, e esta não é o matadouro que a faz, o matadouro só presta um serviço. Falo, claro, de matadouros públicos.
11 Serviços e seus custos - Sobressaem assim três coisas:
a) Há diversos matadouros a prestar o mesmo serviço (com demasiada frequência um mau serviço, pois enfrentam prejuízos enormes e isso não incentiva a prestar um serviço de qualidade).
b) Há uma capacidade instalada várias vezes superior ao consumo local.
c) Pela sua dimensão não têm massa crítica para cumprir a certificação, em todas as suas formas. Não há um só matadouro no distrito que o Continente, por exemplo, aceite para seu fornecedor.
d) a + b + c = Acumulação de prejuízos (diz-se, no momento, ser de cerca de 400.000 euros anuais) e incapacidade de abastecer muitas das grandes superfícies.

12 Em suma - O que resulta de tudo isto, quais os benefícios de novos matadouros, para o produtor, para o retalhista e para a região, como um todo?
Nada. Absolutamente nada. E direi mais, só poderá ter desvantagens.
Retalhista - poderá beneficiar por não ter de se deslocar a outro, mais longe. No caso de ser um agente económico, que leva carcaças para o litoral (seria caso único), terá menos custos de transporte.
Produtor – a redução de custo de transporte do retalhista irá reverter para o produtor? E a ser assim, em quanto importa? Migalhas.
Região – que vantagem haverá em, visto o histórico de 20 anos, acrescentar mais um matadouro deficitário ao rol dos demais?
Isto favorece os produtores e a região? Em que medida? O que os comerciantes poupam em transportes e isso reverte para os produtores? e se assim for, isto chega para a fileira? Chega para mudar a pecuária transmontana? Para melhorar a qualidade de vida dos produtores? para rentabilizar mais matadouros? Para evitar a desaparição dos efectivos? E a desistência dos criadores? Para mudar o paradigma da falência iminente do sistema? Sejamos pragmáticos. Os matadouros existentes promoveram de alguma forma a melhoria de vida do criador? Travaram a redução de efectivos nos seus concelhos?
13 Exemplo prático - Uma dose de cabrito ou borrego num restaurante custa 20 euros, como mínimo, e um quilo dá para 3 a 4 doses. É pago a 50/60 euros ao produtor. Para onde vão os outros quilos todos? No hipermercado X em Lisboa o quilo de cabrito é vendido a 18.5€ por quilo. Não preciso de recordar a ninguém que o produtor anda atrás dos animais 365 dias por ano, umas 8 a 12 horas por dia?
As margens de lucro que normalmente se consideram aceitáveis na generalidade das indústrias oscilam entre os 15% e os 25%. Nestas áreas atingem frequentemente mais de 100%, dada a extensão da cadeia de distribuição e as mais valias da passagem por várias mãos. Daqui resulta que o esforço do produtor, a sua mais valia, a qualidade do produto final, a capitalização na região são desbastadas, elo a elo da cadeia. Perde-se 70% da mais valia possível.
14 Soluções - Dito isto, pareceria mal gastar tanta paciência ao leitor sem dar uma solução. E essa é escandalosamente simples.
Vamos cooperar, trabalhar todos para o mesmo fim.
Nada de novo, nada de transcendental nada mais, para além de boa vontade e boas contas.
Vamos aprender a vender. A arranjar clientes, quanto mais “finais” melhor. Vamos especializar-nos em diversas espécies animais, em desmancha, em segmentos de mercado, em distribuição e em remunerar os nossos produtores condignamente. Obter a sua confiança (não é fácil).
Vamos mostrar aos consumidores finais que somos indispensáveis: para os abastecer, para a biodiversidade, para o bem estar animal, para reduzir os incêndios, para ajudar a manter vivo o interior do país (80% do território). Temos de demonstrar aos consumidores que cumprimos o que dizemos; façamos por que venham cá, consumir aqui os nossos produtos.
Para isso temos de reduzir os 400.000 euros de prejuízo e até chegar aos lucros, conseguindo que os abates fora da região passem a ser aqui feitos.
Uma dúzia de associações de produtores tem um projecto para isso. Comercializar em conjunto, sobretudo carnes com DOP, queremos valorizá-las e vendê-las directamente ao consumidor final e restaurantes. É tempo de apostar nos elos que verdadeiramente importam, que remuneram a produção.
Temos projectos para isso, temos ideias, temos acções iniciadas, temos todo o conhecimento necessário, temos projectos de investimento submetidos e, sobretudo, temos vontade para isso. Temos a massa crítica necessária e diversas entidades a colaborar connosco. Não deixamos de precisar da colaboração dos poderes públicos. O que faríamos com a verba destes prejuízos? Em poucos meses teríamos marketing apropriado, um veículo de recolha e dois de distribuição, um centro operacional e em três anos teríamos quatro entrepostos em zonas chave do país.
Aos comerciantes deixo um agradecimento. Bem hajam. Por fazerem aquilo que nunca até hoje os produtores quiseram fazer, por drenarem a produção das explorações. Há espaço para todos, até para colaboração directa.
Apoiar esta iniciativa é apoiar a produção. É tempo de mudar.
A guerra do abate é inútil e ineficiente. E cara, muito, muito cara.

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