A opinião de ...

As Eleições Legislativas de 2019

Apesar de estas terem sido umas eleições com um desfecho mais ou menos anunciado, vale a pena sublinhar os aspectos que, sem obedecer a uma estrita ordem de importância, merecem, do meu ponto de vista, ser cotejados:
Em primeiro lugar, não posso deixar de referir o número assustador daqueles que se abstiveram de votar, malgrado as insistentes e oportunas intervenções feitas pelo Presidente da República, pela Comissão Nacional de Eleições e pelos líderes partidários. Mesmo assim, uma abstenção que ronda os 46% dos eleitores inscritos, transforma o acto eleitoral numa escolha em que intervieram pouco mais de metade dos eleitores. Tal circunstância constitui, em si mesmo, um sinal do descontentamento, do distanciamento e, nalguns casos, do desprezo com que muitos portugueses vêem a política, os partidos e, em particular, os seus protagonistas. É um caso da maior seriedade e preocupação, que requer um olhar atento e não o tradicional empurrar com a barriga para a frente, que tem afastado, cada vez mais, os eleitores do seu dever cívico mais importante – votar.
Em segundo lugar, sem que tal esteja separado do primeiro, estas eleições revelaram o mais desconfortável deserto de propostas e de ideias para o país. A campanha foi feita de casos, misturada com aquelas manifestações anódinas, quase a roçar a imbecilidade, a que dão o nome de “arruadas”, onde se distribuem esferográficas e “barretes” para tentar “vender o Produto”. Uma coisa inenarrável e que demonstra a falta de originalidade, de elevação e de capacidade para promover uma campanha que sirva para esclarecer, para incluir e para mobilizar.
Em terceiro lugar, o aparecimento de novos protagonistas que, cavalgando a onda de descontentamento que se pressente, à mistura com um populismo de soluções simples para problemas cada vez mais complexos, obtiveram os votos necessários para chegar a S. Bento. Incluo neste “circo”, também, por motivos que se cruzam, a impressionante “debacle” do CDS/PP, que vê agora o espaço da extrema-direita e da direita liberal ameaçado pelos novos actores e que não vai ter vida fácil para se posicionar no espectro político da direita e do centro direita, no futuro próximo. Do mesmo modo, a extraordinária subida do PAN revela a insuficiência dos partidos tradicionais para incluírem, nas suas agendas, temas que o tempo e o modo como os cidadãos olham para a sociedade mudou e, por via disso, lhes impõe uma criatividade que não tiveram.
Quanto ao PSD e a Rui Rio, a quem as sondagens, até ao ressurgimento do “caso de Tancos”, o davam como perdedor sem redenção nem remédio, teve, apesar de tudo, um resultado que, sem embargo ter sido o pior de sempre em eleições legislativas, foi melhor do que vaticinava a comunicação social. No entanto, mesmo neste “calvário do PSD/Rio”, conseguiu ser o partido mais votado no distrito de Bragança e, simultaneamente, ter aqui a percentagem mais elevada de todo o país, algo que deve servir para reflectir sobre o que permitiu tamanha vitória em Bragança. Porém, Rui Rio, que surgiu na liderança do PSD como alguém que queria trazer um “banho de ética” à política, viu-se enredado em questões que o fragilizaram e o desacreditaram como alternativa. A somar a isso, a coligação espúria, incluindo o CDS, com o Bloco de Esquerda e a CDU, na questão dos professores, contribuiu para revelar que a incoerência do PSD estava condenada a não ser alternativa nenhuma. Apesar de tudo, o resultado das eleições conseguiu contrariar as piores previsões, o que, certamente, contribuirá para um esgrimir de forças no futuro próximo do PSD.
Em quarto lugar, o distrito. Em Bragança, o PS perdeu, e se é fácil dizer que esta é uma terra onde por tradição o PSD ganha, não é menos verdade que o PS tem sete das doze Câmaras do distrito e que, há quatro meses, para as eleições europeias, ganhou. Na minha apreciação de cidadão que não teve qualquer intervenção partidária nos últimos três anos (e que a continuar assim muito dificilmente voltarei a ter), direi que faltou tudo, ou quase tudo, a tal ponto de dar ao PSD a maior vitória no todo nacional.
Por norma, os governos do PS mostraram sempre particular sensibilidade para os problemas do interior profundo, criando condições para o desenvolvimento de infraestruturas essenciais e promovendo, a vários níveis, o investimento público para que o interior tivesse mais oportunidades. Convém não esquecer que a excelente rede viária de que hoje desfrutamos foi obra de governos do PS e que o apoio nos domínios da Segurança Social e da Saúde tiveram o seu maior impacto nos governos do PS. Nesta legislatura, mesmo com uma Unidade de Missão para tratar das questões do interior, pouco, ou quase nada, foi feito. A par disso, tenho de o referir, o PS não revelou qualquer capacidade de liderança no distrito e, tal como no futebol, em política também se perde o jogo por falta de comparência.
Com efeito, não basta ser eleito para liderar um partido num concelho, num distrito ou num país, porque o resultado da responsabilidade, associada ao êxito de quem é eleito, traduz-se nas vitórias e nas derrotas que se têm. E numa leitura que, como disse, é a de um cidadão que há três anos não tem intervenção partidária, não me apercebi, neste lapso de tempo dos últimos três anos, que o PS tivesse qualquer liderança, apesar de ter eleitos para essas funções. Foi pena!

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