A opinião de ...

3. Da Guerra à constituição do MFA e conspirações contra o regime!

Ultrapassado o «vendaval» Humberto Delgado de 1958, o início da guerra em África reforçou os laços entre o Poder Político e as Forças Armadas. Porém, a partir de 1968 a substituição de Salazar por Marcello Caetano, o desgaste pela continuidade do conflito e as crescentes exigências de recurso militares alterou o contexto. Obrigados a uma comissão de dois anos, o moral dos soldados diminuiu com os atrasos nas rendições. Relativamente aos oficiais e sargentos, a quem se permitia comissões de 4 anos seguidos ou 6 alternados, ao voluntarismo sucedeu a imposição, por manifesto cansaço do Ultramar. Quanto a Caetano, a braços com a pressão da comunidade internacional, por um lado vincava que «as forças militares que servem na África portuguesa e hoje têm cerca de metade dos seus efectivos constituídos por africanos, não fazem a guerra: asseguram a paz», enquanto por outro questionava se os militares iriam aguentar muito mais tempo o «esforço exigido».
Se, em Angola, a guerrilha estava contida, nos teatros de Moçambique e, principalmente, da Guiné a situação militar inquietava. A indisponibilidade do regime em equacionar uma solução política reforçou o descontentamento entre militares do Quadro Permanente (QP), antevendo a impossibilidade de vitória militarmente conclusiva. Entretanto, o governo, na procura de reforçar os deficitários postos de subalterno e capitão, optou pelo do Quadro de Complemento. Depois, aberta a possibilidade de oficiais milicianos frequentarem a Academia Militar (AM), em 1969 foi criado o Quadro Especial de Oficiais, que permitia uma carreira de oficial até tenente-coronel. Por fim, decidiu-se a graduação no posto de capitão a oficiais milicianos selecionados durante a frequência dos respetivos cursos, acautelando, no entanto, a antiguidade dos oficiais oriundos da AM. E, assim, a desproporção entre os oficiais QP e os milicianos originou que nas companhias quase todos os oficiais subalternos fossem milicianos. Mesmo os sargentos cingiam-se à componente administrativa da subunidade.
A situação extrapolou com a publicação do Decreto-lei Nº 353/73, de 13 de julho, pelo Ministro da Defesa, Sá Viana Rebelo. Permitia aos capitães milicianos integrarem as armas combatentes depois de um curso intensivo de dois semestres na AM (os cadetes frequentavam-na durante três anos). Como a antiguidade que contava era a de tenente (dada na segunda comissão) e não a da frequência do curso da AM, os capitães oriundos de cadete eram ultrapassados por aqueles. Estas medidas, além de desvalorizarem o ensino na AM, romperam o elo de fidelidade entre o regime e os oficias de escalões intermédios do QP. O Ministro procurou «emendar a mão» publicando o DL Nº 409/73, de 20 de agosto que, ao salvaguardar os interesses em termos de antiguidade dos oficiais superiores sem contemplar as reivindicações dos capitães, agudizou a insatisfação destes e dos oficiais subalternos.
Portanto, se a evolução da guerra pode ser considerada o catalisador geral do «Movimento dos Capitães», foram questões de carreira e de folha salarial que motivaram uma postura antiguerra e depois contra o regime. Postura que nem a anulação dos dois Decretos e uma nova tabela salarial em benefício dos capitães, entretanto aprovada por Marcello Caetano, estancou. Seguiu-se uma série de reivindicações e de reuniões conspirativas, iniciadas na Guiné, de que destacamos: 1) reunião de Alcáçovas, a 9 de setembro de 1973, com 136 capitães e oficiais subalternos; 2) Óbidos, a 1 de dezembro, onde 180 oficiais elegem uma comissão coordenadora do Movimento dos Oficiais das Forças Armadas (MOFA), alargando o movimento à Marinha e à Força Aérea; 3) reunião da comissão coordenadora na Costa da Caparica, a 5 de dezembro, onde Vítor Alves, Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Lourenço foram nomeados para a direção; 4) Cascais, a 5 de março. Com cerca de 200 oficiais presentes e o dobro representados, foi aprovado o documento «O Movimento, as Forças Armadas e a Nação» e o MOFA passou a designar-se Movimento das Forças Armadas (MFA), para ser mais abrangente e inclusivo; 5) a 12 de março ocorreram duas reuniões no Algueirão, de manhã, e em Lisboa, de tarde e, no dia seguinte, em Santarém e no Dafundo.
Os dados estavam lançados. Três dias depois o Regimento das Caldas da Rainha saía à rua …

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