A opinião de ...

É urgente inverter a espiral de empobrecimento

Será mais ou menos inevitável que Portugal venha a sofrer, no curto/médio prazo, em consequência da pandemia que enfrentamos, um agravamento da forte crise económico-financeira e, igualmente preocupante, da crise social já instaladas.

O desemprego atingiu valores semelhantes a 2017 e poderá ainda aumentar. Quer devido a pequenos negócios que já não abrirão, quer devido à falência de grandes e médias empresas, quer ainda pelas rescisões por mútuo acordo por forma a adaptar os recursos humanos à quebra nas encomendas…. Muitos serão pois os fatores que poderão levar a um aumento no número de desempregados.

Os indicadores de um estudo do Observatório de Luta Contra a Pobreza, de Lisboa, revelou que o aumento do desemprego tem maior impacto nos trabalhadores com contratos a termo ou em tempo parcial. Dito de outra maneira, no grupo de trabalhadores onde o risco de pobreza já era o mais elevado, de que são exemplo os sectores da restauração e do turismo, na região do Algarve.

Num contexto economicamente muito mais positivo, como foi o ano de 2019, Portugal contava já com quase 60% dos quatrocentos mil desempregados em risco de pobreza ou exclusão social e apenas 30.6% estavam a beneficiar do subsídio de desemprego. Estes números agravaram-se em 30% em média.

Os dados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR) 2019 e ainda o estudo mais recente «Portugal, Balanço Social-2020”, de Susana Peralta, Mariana Esteves e Bruno Carvalho são preocupantes, sobretudo os que indicam uma maior vulnerabilidade da própria população empregada pela baixa remuneração.

O risco de pobreza ou exclusão social dos trabalhadores aumentou em 2020, e era particularmente mais elevado junto dos que trabalhavam por conta própria,

Esta crise pandémica veio exponenciar a precaridade e os baixos salários como fatores de vulnerabilidade que os dados do ICOR de 2019 confirmam.

Os baixos salários, associados a outros fatores, como o nível de proteção social insuficiente, o ter crianças dependentes ou o viver sozinho aumentam exponencialmente o risco de pobreza ou exclusão social.

Nas famílias monoparentais este risco é particularmente alto e, para este tipo de agregado, a inserção no mercado de trabalho não significa necessariamente uma proteção à pobreza pois, segundo os referidos estudos, mais de ¼ dos trabalhadores que vivem sozinhos e têm a cargo uma criança dependente estão em risco de pobreza.

Para travar a reprodução da pobreza será decisivo investir nas famílias com a preocupação de retirar os mais novos desta espiral de empobrecimento.

Finalmente, os estrangeiros extracomunitários, a população com baixos níveis de escolaridade, as pessoas com incapacidade, os arrendatários, entre outros, são os mais expostos à pobreza e aos impactos da atual.

Pelo que é necessário Ver, Julgar e Agir. São urgentes novos programas de apoio social para retirar os desempregados, os subempregados, os mal-remunerados, os com dependentes e ascendentes a cargo, os trabalhadores independentes e muitos outros da situação de carência em que se encontram. Para travar a reprodução da pobreza e promover a distribuição da riqueza.

Pedro Guerra
Comissão Diocesana Justiça e Paz

Edição
3831

Assinaturas MDB