A opinião de ...

Mais tempo e menos juros

O folhetim tem vários episódios e distintas personagens, nacionais e estrangeiras. A direção de atores é da responsabilidade do ministro das Finanças alemão. A história começa quando, na reunião do Eurogrupo de 26 de novembro passado, foi decidido conceder condições mais flexíveis à Grécia para cumprir o programa de ajustamento. O acordo entre a Zona Euro e o FMI prevê: 1. descida de 100 pontos base da taxa de juro cobrada nos empréstimos concedidos bilateralmente; 2. extensão de 15 anos das maturidades dos empréstimos; 3. redução de dez pontos base das comissões referentes aos empréstimos do Fundo Europeu de Estabilização Financeira; 4. extensão de dez anos no prazo de pagamento dos juros dos empréstimos. 

Questionado pelos jornalistas se Portugal poderia beneficiar do princípio da igualdade de tratamento, o presidente do Eurogrupo afirmou: “Tomámos a decisão há meses, ou mesmo há mais de um ano, que temos de aplicar as mesmas regras aos outros países sob programa”. Idênticas afirmações foram proferidas pelo ministro das Finanças português, no encerramento da discussão do Orçamento do Estado para 2013, na Assembleia da República. Poucos dias depois, chega a advertência do todo-poderoso ministro alemão, dando a entender que Juncker e Gaspar não tinham estudado o guião. De imediato, ambos dão o dito por não dito. As mesmas condições que a Grécia? Mas quem quer ser igual à Grécia? Pois não se vê que a Grécia é caso único? Opinião que é corroborada por Durão Barroso” É notável como, em tão pouco tempo, Portugal conseguiu distinguir-se de uma situação como é a da Grécia” e, concluiu que, embora haja “a possibilidade de conseguir uma equiparação das condições”, isso não é desejável. Lá está, parece que a Grécia tem lepra. 

Eis senão quando entra em cena o Presidente da República, dizendo «não ver razão para que não seja reduzida a comissão cobrada a Portugal». E, num implícito puxão de orelhas ao primeiro-ministro, vai dizendo que «a vida na União Europeia é uma negociação permanente” e que as negociações às vezes são muito difíceis, mas que não podemos desistir. Alinhando pelo mesmo diapasão de Cavaco Silva e demarcando-se das posições do governo, Paulo Portas é de opinião que “Portugal deve valorizar e evidenciar a regra segundo a qual quando há circunstâncias institucionais semelhantes se aplicam regras semelhantes”. Com o enredo a complicar-se cada vez mais, vem Passos Coelho dar o seu contributo, dizendo uma coisa num dia e o contrário no outro. Em entrevista à TVI, esclareceu mesmo que foi por iniciativa dele e do primeiro-ministro irlandês que se estabeleceu o princípio de igualdade de tratamento a todos os países da União Europeia sob assistência financeira e considerou que esse princípio tinha de ser respeitado. Tal foi a confusão que Marques Mendes remata à baliza do governo, acusando Vítor Gaspar de “fazer dos portugueses parvos ou atrasados mentais”. 

É evidente que só as medidas referentes aos empréstimos do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira podem ser aplicadas a Portugal. Mas bastava isso para Portugal ter mais tempo e pagar menos juros. Como há muito vem dizendo o líder do PS, “Portugal pode e deve vir a beneficiar de melhores condições para garantir um ambiente mais favorável para o crescimento económico”. O governo tem de explicar a Bruxelas que Portugal quer cumprir os seus compromissos mas “as condições desse cumprimento devem ser adaptadas à realidade”, que mudou desde o início do ajustamento financeiro e que o país sairá da crise por via do crescimento e não da “austeridade custe o que custar”, afirmou ainda António José Seguro. Opinião que é apoiada por economistas apoiastes do governo. Para João César das Neves, não é “de todo irrelevante” o que Portugal pode poupar com a redução de juros e comissões. Segundo João Duque, Portugal e a Irlanda “podem ter a certeza que vão conseguir obter mais ajuda, uma vez que os resgates da zona euro estão desesperadamente a precisar de histórias de sucesso”. 

Se o primeiro-ministro se deixar de teimosias, reconhecer que errou e renegociar com Bruxelas as condições da dívida, poderá aliviar um pouco a pesada carga que colocou sobre os ombros dos portugueses. Será ele capaz dessa ato de humildade? Ver para crer.

Edição
3400

Assinaturas MDB