A opinião de ...

O legado que deixamos

O Papa Francisco acusou, esta segunda-feira, os países e empresas do hemisfério Norte de enriquecerem à custa da exploração dos recursos dos estados pobres do Sul, alertando para as consequências ambientais desta atuação.
“Estamos a espremer os bens do planeta. A espremê-los como se fossem uma laranja”, afirmou o chefe da Igreja Católica, lia-se numa notícia da Agência EFE, de Espanha, que citava um vídeo divulgado sobre o tema da Jornada Mundial da Oração pela Criação.
Nesse vídeo, o Papa Francisco acusa os países e as empresas do Norte de terem enriquecido a explorar os recursos do Sul, gerando com isso uma “dívida ecológica”.
“Quem irá pagar essa dívida ecológica?”, questionou, acrescentando que estes impactos ecológicos aumentam porque as multinacionais fazem fora dos seus países aquilo que não lhes é permitido fazer nos seus países de origem.
Nesse sentido, o pontífice defendeu que os recursos do planeta devem ser repartidos de “forma mais justa e equilibrada”.
Ora, aquando da discussão do pacote de apoio aos países europeus para fazer face aos problemas provocados pela pandemia de covid-19, foram, precisamente, os países do norte da Europa a levantar mais condições e restrições às ajudas para os países do sul.
Uma guerra que já vinha de trás, de há pelo menos oito anos, quando a Troika entrou em força e impôs uma série de medidas castigadoras aos países do sul (Grécia, Portugal, Espanha e Itália, ainda que menos nestes dois países).
Não deixa de ser irónico vir o Papa Francisco lembrar que os países mais industrializados, mais a norte, se aproveitam dos recursos dos países mais pobres, mais a sul.
O Sumo Pontífice falava, sobretudo, das dicotomias existentes nas Américas (do Norte e do Sul) mas as suas palavras podem ser aplicadas a muitas outras situações e regiões.
Por cá, a exploração de recursos também entrou na ordem do dia desde que o Mensageiro de Bragança trouxe a lume a intenção de exploração de uma mina a céu aberto de volfrâmio aqui ao lado da fronteira.
Apesar de situada em Espanha, os efeitos nefastos caminhariam direitinhos para o lado de cá da fronteira, onde está situado um dos maiores parques naturais do país e utilizado como desculpa para muita da inação existente.
Mas o mesmo já aconteceu, por exemplo, com a instalação de parques com centenas de torres eólicas de produção de energia. Cá são proibidas pelo impacto ecológico mas, assim que se passa a linha de fronteira (às vezes nem isso), as regras foram mandadas às urtigas (como a de consultar o país vizinho, por exemplo) e o cuidado com o ambiente também.
Por isso, o aviso do Papa Francisco deve, por cá, ser levado mais a sério. Sob pena de espremermos tanto a nossa laranja até já não restar nenhum sumo para deixar às gerações vindouras.

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