A opinião de ...

Memórias do 25 de Abril: I - os pretextos para o golpe militar

Vários factores se conjugaram para que os militares e a opinião pública viessem a ser favoráveis ao derrube do IV Governo do Estado Novo (27 Setembro de 1968-24 de Abril de 1974), presidido por Marcelo Caetano.
Entre esses factores, referirei quatro: O primeiro, as promessas não cumpridas de liberdade de expressão política e de organização e de representação partidária, apresentadas em 1969 pelo Governo à opinião pública como objectivo de modernização política e social do país e de integração no contexto político e social europeu. As eleições legislativas de 1972 são o contrário de todas essas promessas.
O segundo factor, é de natureza económica. Impulsionada pela economia da guerra, pela emigração e pela adesão de Portugal à EFTA (Associação Europeia do Comércio Livre, 1956-1960), a economia portuguesa teve, entre 1960 e 1971, 12 anos de crescimento numa média de 8% ao ano. Este crescimento da economia caiu abruptamente em 1969 (2,1%) e em 1974 (1,1%). Além disso, em 1973, a inflação já atingiu os 13,7%. Marcelo Caetano falou então de fim do «período de vacas gordas» e, devido ao expansionismo económico e da administração pública de todo o período marcelista, a dívida pública sobre para 14% do PIB, o que, para o tempo, de contas equilibradas, era uma desgraça. Acresce que 35% da despesa pública foi, em 1973, para a renovação tecnológica das forças armadas, ressentindo-se o investimento económico e social deste facto. O descontentamento popular alastrava.
O terceiro fator é de ordem militar e tem a ver com a Guerra Colonial. A nova tecnologia militar do PAIGC, na Guiné, com mísseis que derrubavam todos os aviões e helicópteros portugueses, evidenciou o arcaísmo das armas portuguesas no teatro da guerra. Reclamava-se uma solução política e já não militar mas ninguém sabia bem em que consistiria tal solução. No plano social, a adesão à guerra era cada vez menor e quase só os filhos dos pobres iam para a frente de batalha e cada vez mais mal preparados. A motivação para a «fuga à tropa» através da emigração clandestina, era cada vez maior e a falta de jovens para abastecer as fileiras da guerra era notória.
O quarto fator, finalmente, é ainda de ordem militar mas de carácter corporativo. A partir de 1970, carecido de capitães para tantas frentes de guerra, o Governo decide recrutar jovens alferes milicianos que tivessem feito uma comissão no ultramar e submete-os a cursos intensivos para capitães milicianos. Em surdina, estalou a revolta entre os tenentes e capitães do quadro permanente, os quais, pelo menos até ao posto de Coronel, se viam sofrer o concurso dos oficiais milicianos. Esta revolta fez juntar no movimento de contestação cada vez mais oficiais e, a partir de Outubro de 1973, com a chegada de Melo Antunes e de Vítor Alves, ganha um pendor político, no sentido de acabar com os capitães milicianos, com a guerra colonial e no sentido de democratizar o país.
Em finais de 1973, o país estava portanto num impasse. Veremos, a partir do próximo número, como se sai dele.

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3465

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