A opinião de ...

Centeno e as virgens ofendidas

É inacreditável que, em pleno século XXI, seja possível elaborar uma Lei ad hominem com o único objetivo de impedir um cidadão competente e responsável de aceder a um cargo para o qual está, sem qualquer dúvida, preparado como poucos outros! É inaceitável que tal desplante seja perpetrado, em plena luz do dia por representantes do povo, sabendo-se bem que o povo gosta, aprecia e valoriza o respetivo cidadão como nenhum dos que o pretendem manietar! Tento perceber a causa desta inexplicável perseguição ao ex-ministro das Finanças que, não sendo um temível tribuno apenas pode ter desencadeado a aversão dos deputados pela eficácia da sua competência que nenhum ousou questionar! Claro que não é isso que alegam. Dizem que o fazem em nome da ética. Qual ética? A das moradas fictícias, para aumentar as ajudas de custo, dos curricula adulterados e das falsas presenças em plenário? Terão esquecido a célebre cena em que uma deputada, conhecedora do meio e dos personagens, apanhada na falcatrua da marcação de ponto, acusou todos os seus colegas de serem falsas virgens ofendidas, como se a denúncia da marosca fosse um crime de lesa-pátria?
É verdade que, ao contrário do que reclamava a tal deputada, nem todos os deputados são permeáveis a interesses duvidosos, faltosos, trapaceiros e aproveitadores. Há os que podem, justamente, reclamar ter um comportamento ético e impoluto. Esses têm o dever de permitir a Mário Centeno fazer idêntica reclamação. Os outros deveriam, antes de apoiar tal iniciativa resolver os graves problemas de incompatibilidades dentro de portas. Porque essas sim podem lesar gravemente a coisa pública.
No Banco de Portugal quer-se alguém competente e capaz ou um burocrata cinzento e mediano desde que esterilizado dos supostos vírus de pretensos conflitos de interesse?
É estranha esta sanha purificadora da Assembleia da República quando a história recente nos mostra situações que parecem provar exatamente o contrário. Miguel Beleza e Guilherme de Oliveira Martins foram diretamente do Governo para o Banco de Portugal e Tribunal de Contas sem que lhe tenha sido apontados a mínima crítica por apoiantes e adversários políticos que, obviamente, ambos tiveram. Pelo contrário a Victor Constâncio e Carlos Costa, supostamente já devidamente “quarentenados” foram alvo de grossas acusações e poucos vieram a terreiro em sua defesa! Porquê esta perseguição a Mário Centeno a quem tantos portugueses estão gratos e tecem tantos elogios e a quem ninguém se atreveu a apontar qualquer menor competência?
Sendo o Banco de Portugal o regulador do sistema bancário o importante no seu governador é a independência relativamente ao fortíssimo lóbi da finança. E, sabendo da força que esta classe tem e da influência que é capaz de exercer, o aparecimento, de repente, de uma corrente a querer impedi-lo de tomar posse, só lhe aumenta o curriculum. Por mim, a existência de um largo grupo de pressão a querer travar a progressão do alto e qualificado quadro do Regulador a que, naturalmente pretende presidir, dá-me muito mais tranquilidade do que um insípido “nihil obstat” para, em meu nome, colocar na ordem a poderosa e rica classe dos banqueiros.
Porque, corrijam-me se não é verdade, o Banco de Portugal vai regular a Banca e não o Ministério das Finanças...

Edição
3786

Assinaturas MDB