A opinião de ...

A lógica da batata

O princípio básico, fundador do conceito de justiça baseia-se numa permissa simples de enunciar: quem cumpre, quem pratica o bem, quem evita males a si e a outros deve ser recompensado; quem pelo contrário prevarica, pratica o male e prejudica outrém deve ser penalizado.
O art. 20 da Constitução Portuguesa assegura a todos os portugueses o acesso ao direito e aos tribunais  para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
 
Vejamos. O novo mapa judiciário vai acabar, entre outras razões, para reduzir custos, por tanto por razões económicas com vários tribunais no nordeste por, sobretudo, não terem processos em numero mínimo exigível que os justifiquem. É certo que há tribunais que mesmo não tendo o número mínimo definido são mantidos (a aplicação deste fator levaria, segundo o documento “Linhas Estratégicas para a Reforma da Organização Judiciária” ao encerramento de 61 tribunais enquanto que “apenas” se recomenda o fecho de 47) o certo é que bastaria atingir esse número mágico (250) para que qualquer estabelecimento de Justiça  fosse poupado à espada liquidatária do Ministério da Justiça!
 
Ou seja, se em vez de gente cordata, benevolente, bondosa, razoável e avessa à litigância, fôssemos, no nordeste, utentes intensivos da máquina da justiça, atingindo o número mágico de “sobrevivência” todos os nossos tribunais seriam poupados. Se em vez de resolvermos civilizadamente e com bonomia as nossas próprias divergências; se tal como a conhecida empresa que enviou para julgamento alguém que tinha furtado uma caixa de creme, também nós fizéssemos funcionar a justiça, por cada diferendo público e injurioso de terreiro de cada aldeia, se cada figo lampo (ou vindimo) colhido indevidamente em árvore alheia implicasse pronunciamento de juiz, se cada atravessamento em terra de outrém , levasse o infrator a sentar-se no banco dos réus, se cada dívida ou atraso no pagamento empurrasse os relpasos para a barra da justiça, em suma se obrigássemos o erário público a gastar recursos desproporcionados por todas as questões de lana caprina, se o impuséssemos ao conjunto dos cidadãos custos elevados de aplicação de justiça, se contribuíssemos ativamente para delapidar ainda mais as  parcas disponibilidades dos cofres do Estado, este Estado, pela mão de quem o administra, em nosso nome, recompensar-nos-ia  com a manutenção integral dos instrumentos, pessoas e equipamentos existentes. Como pelo contrário nos comportamos como pessoas civilizadas e evitamos recorrer à Casa da Justiça por dá cá aquela palha, como poupamos milhões aos depauperados cofres ministeriais, somos castigados com a retirada do pouco que a Estado nos ia ainda  “permitindo”.
 
Se até no futebol a penalização de uma falta só faz sentido se com a mesma não se beneficiar o infrator, que dizer de um ministério que tem por objeto, precisamente, praticar, promover e assegurar o exercício da justiça. Que a justiça seja justa é o mínimo que qualquer cidadão de bom senso pode reclamar.
 

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