A opinião de ...

Lágrimas da Natureza

Naquele domingo de verão, ao fim da tarde, tudo estava calmo. Não bulia a folha das árvores, nem se via o habitual voo das aves.
O céu apresentava-se cinzento, mostrando, de onde em onde, consideráveis espaços soturnos, prenunciando alguma tragédia!
O ar abafava, o calor não podia suportar-se, e nem uma suave brisa corria para amenizar esta pesada situação!
Ninguém nas ruas. Nos campos, a vida parou.
Toda a gente, nas suas casas, estava suspensa, à espera do que iria acontecer; e os mais devotos desfiavam, nervosos, as contas do rosário.
Subitamente, um clarão imenso desenhou, no ar, fugazes arabescos incandescentes que feriram os olhos de quem, ansiosamente, esperava suportar uma enorme catástrofe! E logo, passados breves segundos, ouviu-se bem perto, um imenso, breve e seco estrondo (seguido de outros menos intensos, os quais, gradualmente se foram extinguindo), que fez tremer o chão e abalou a estrutura das casas, deixando paralisada toda a gente – muita a invocar Santa Bárbara – a ponto de nem conseguir reagir aos vários focos de incêndio que se seguiram ao ribombar assustador!

E o grande incêndio começou!
Numa precipitada corrida, várias chamadas foram recebidas no Quartel dos Bombeiros que, mesmo bem organizados, não conseguiram impedir que aquelas chamas se propagassem pela encosta da serra, numa área de tão difícil acesso que os obrigou a terem de escolher a melhor forma de aproximação.
Entretanto, abriram-se as portas dum furioso vento que, na sua impetuosa cavalgada, arrastou consigo as chamas e as dispersou por todo o lado. E, num repente, altas e assustadoras labaredas desenhavam, na noite, uma imagem fantasmagórica!
Perante aquela situação, os esforçados bombeiros iam atacando o fogo nas várias frentes que se formaram; e, porque não tinham o apoio dos meios aéreos, mais e mais se empenhavam para conter aquele braseiro!
As árvores eram literalmente devoradas pelo fogo a que as ervas e os arbustos forneciam precioso combustível. Muitos animais foram morrendo…
Numa manobra menos bem calculada, ao descer um caminho estreito, o condutor dum camião, que seguia sozinho, não conseguiu segurá-lo da melhor forma, deixando, por isso, que o mesmo capotasse e fosse cair numa ravina. Socorrido, de imediato, verificou-se que estava inconsciente e muito ferido – o que fez com que fosse logo transportado ao hospital, onde, ao fim de uns dias, felizmente, se restabeleceu.
Pairava no ar uma impiedosa nuvem de fumo que sufocava os operacionais e insistentemente lhes martirizava os olhos, enquanto a ventania levava para longe o fétido cheiro que ali se criou. Uma localidade ameaçada pelas chamas teve que ser evacuada, deixando para trás, aflita, os animais e outros bens – facto que lhes causou profunda intranquilidade, potenciada pelo medo que vinha da tragédia que cada vez mais aumentava.
Vieram reforços de homens e de viaturas; mas só depois do nascer do sol, já com os meios aéreos a ajudar, o fogo foi dominado.
Todos puderam contemplar, então, a grande extensão da tragédia, bem como as marcas que ela deixou naqueles que muito se esforçaram por ganhar um combate tão desigual!

Mas a Natureza tinha ainda uma palavra a dizer.
Uma inimaginável quantidade de chuva, caindo como num dilúvio, precipitou-se pela encosta da serra, levando à sua frente os inumeráveis despojos de tão grande desgraça!
Eram lágrimas de dor que a Natureza não pôde conter!

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3840

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