Não é não é não
Querem por força fazer-nos crer que o “não é não” em que se baseou que a última campanha eleitoral da AD quer a anterior, continua válido, apesar dos evidentes sins; que continua vivo, mau grado a notória falta de sinais vitais.
Quer o pretendente, quer o incumbente Montenegro afirmou, garantiu e jurou, repetidamente antes das eleições que ao contrário do seu antecessor, Rui Rio, com ele a extrema direita estaria totalmente arredada do governo que pretendia liderar. Fosse por isso ou não, como sabê-lo?, o certo é que enquanto o antigo edil portuense perdeu a contenda eleitoral de forma retumbante, o ex-líder parlamentar de Passos Coelho ganhou-as e, repetindo o refrão, depois de o ter minimamente honrado, reforçou a votação. Seria de esperar que não houvesse cedências nesse aspeto até porque o próprio deve ter considerado ser essa uma mais valia ou, de outra forma, não insistiria nessa fórmula quando se apresentou de novo a sufrágio popular. Não só por isso mas ainda e sobretudo porque na atual legislatura tem “ao seu dispor” um PS menos aguerrido e muito mais cooperante, não só pela diminuição de representatividade mas também pela atitude assumida pelo seu novo Secretário Geral.
E, porém, é com a extrema direita que a AD se entende e a quem cede, precisamente nas áreas em que aquela é mais agressiva, mas radical e mais extremista. E, digam o que disserem, jurem rejurem o que entenderem, não se trata de “mero acordo parlamentar pontual”. As alterações propostas representam uma viragem ideológica nos aspetos humanistas social democratas e democratas cristãos. Se fosse “apenas” parlamentar seria natural oficializa-lo nos Passos Perdidos e não na residência oficial do Primeiro Ministro, onde foi, aliás, anunciado a solo e com grande fanfarronice. E toda esta encenação, podendo, noutros casos ser de somenos, não o é aqui pois a entrada solitária, tal como a saída desacompanhada e triunfal, revelou a figura quase paternalista de alguém que ali veio impor os seus ditames e saiu, declarando terem colhido aceitação as suas principais revindicações. De tal forma foi bem-sucedida a ida a S. Bento que estou em apostar que o inefável visitante, nos escassos momentos em que esperou no hall de entrada, deve ter olhado atentamente nos móveis da sala e nos quadros da parede para começar a pensar no que quererá, no futuro, mudar, substituir ou reformar. Cheirou-lhe a poder, de forma intensa e convincente.
É verdade que não tem ainda qualquer poder executivo. Mas, mais importante, diria mesmo, mais poderoso, é ser capaz de influenciar quem o exerce.
Na minha breve passagem pela política regional tive a oportunidade de participar em algumas reuniões com Ministros, Secretários de Estado e Diretores Gerais. E também numa com o então todo poderoso Duarte Lima. Esta última superou, de longe, todas as outras. Porque enquanto aqueles prometiam moderadamente, justificavam o que não faziam e tentavam convencer das dificuldades da governação, o líder parlamentar de então alardeava o seu incomensurável poder de influenciar, condicionar e pressionar, sem desculpas, sem justificações, sem restrições. Foi assim que auferiu a aura de poder, que efetivamente tinha, tanto assim que, depois da primeira travessia do deserto, quando regressou, sem qualquer cargo institucional, conseguiu reunir no Pavilhão de Portugal a fina flor da politica e da finança em evento de apoio à “sua” Associação Portuguesa contra a Leucemia e que, para além dos inegáveis recursos trazidos para esta, igualmente demonstravam a sua aura e lhe poliam o ego.