A opinião de ...

Recordações de Abril!...

Por ocasião do 44.º aniversário, celebrado na passada semana, apetece-me recordar um pouco a “minha” revolução de Abril. Lembro-me bem da manhã desse dia, quando a minha juventude florescia. A comunicação, apenas a um velho rádio se cingia. Mesmo sem saber nada do que se passava, achei estranho, o Programa da Manhã da Renascença, não se apresentar como habitualmente se apresentava. Mas sem da rotina alterar nada, lá fui para o Liceu Nacional, para mais uma jornada. Não se notava qualquer anormalidade no contexto estudantil. Afinal, Bragança ficava e ainda fica muito longe de Lisboa e a fluidez das comunicações não era o que hoje é. Longe disso. O certo é que as aulas começaram como estava programado. A campainha tocou, mais uma vez, às 08.30 horas, em ponto. Como todos os outros, lá fui eu para a sala n.º 2, do Liceu Nacional de Bragança, no rés-do-chão.
Para iniciar a jornada, aula de Português. Professor, o Dr. Luís Cangueiro. Não obstante pairar no ar qualquer coisa estranha, a aula decorria com normalidade.
Só que, inesperadamente, entrou na sala de aulas o Dr. Eduardo de Carvalho. Com o seu semblante imponente, deu a notícia a toda a nossa gente: Portugal estava a viver uma revolução, a da liberdade. Não perdeu tempo para, logo ali, nos dar uma lição de liberdade e democracia. A primeira, que nunca esqueci. 
Para mim, como para muita gente a notícia constituiu uma surpresa, que se transformou em alegria durante o resto do dia. Nada ficaria igual, tudo passava a ser diferente. Vivia-se a euforia, sem saber em concreto como a situação em Lisboa evoluía.
Porém, à medida que o tempo passava e a revolução se consumava, o grito de liberdade ganhava força e a democracia dava passos de dia para dia. O 25 de Abril passaria a tornar-se uma data histórica para Portugal.
De tudo o resto já muito se falou e escreveu. Das múltiplas manifestações, em Bragança e noutras regiões. Do progresso que se pretendia, da liberdade que se vivia e sentia.
Não posso deixar de recordar esse passado e de considerar a importância da revolução de Abril. Só quem a sentiu e viveu poderá avaliar o seu significado. Sobretudo jovens oriundos do meio rural, como eu, onde as dificuldades se acentuavam, até ao nível da mobilidade para vir estudar para a cidade. Se tivermos em conta que nem todas as aldeias dispunham, sequer, de uma ligação telefónica e que uma boa parte delas não tinha ligação por estrada, verificando-se, também, significativa falta de infraestruturas de abastecimento de água potável e saneamento básico, bem como a ausência de energia elétrica, comparando esses tempos com os atuais, será fácil concluir que a evolução foi enorme, nos mais variados sentidos, desde a revolução de Abril de 1974. A modernidade de hoje nada tem a ver com esse passado recente.
E se a falta de infraestruturas era evidente. A elevada percentagem de analfabetismo, também ela castradora do desenvolvimento transversal, a rudeza do trabalho agrícola, impeditiva de uma produtividade motivadora, eram fatores que potenciavam a dificuldade que as famílias tinham em promover a frequência do ensino básico, preparatório e secundário para os seus filhos, obrigados a deslocarem-se para a cidade. Isto para já não falar do ensino superior ao qual poucos tinham acesso. As desigualdades sociais e educacionais eram gritantes.
Não me esqueço, por exemplo, que na minha aldeia não havia “nada”. As ruas eram em terra batida. Água, só nas fontes e na ribeira. Energia elétrica, ligação por estrada e o saneamento básico, eram inexistentes. E se deste ainda há poucos anos beneficia, a ligação rodoviária, a rede de água e de energia elétrica, podem considerar-se conquistas de Abril.
Na verdade, tanta coisa havia para contar. Fica na memória o passado, saboreando o presente, lutando por um país que jamais queremos amordaçado. Viva, pois, para sempre o espírito de Abril!...

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