A opinião de ...

Língua Charra

Fosse eu dado ao comércio epistolar de elogios na ânsia de daí retirar lucro de vaidade à conta do alheio e trataria de escarafunchar na Língua Charra palavras, palavrinhas e palavrões a ribombarem a colheita de A.M. Pires Cabral que agora coloca ao alcance de todos, e desta forma titulada.
Demonstrações de estima pelo autor (falei com ele uma vez há largos anos em encontro acidental no gabinete do Presidente da Câmara de Vila Real, aonde fui por obrigações profissionais a fim de extirpar a miscelânea existente na Biblioteca Fixa) a todo o tempo e pretexto teci-as o meu progenitor, porque o conheceu tamanino, exaltando as obras dele e avivando episódios da sua meninice, motivo suficiente para eu o ler atentamente.
A qualidade dos livros que o nosso conterrâneo tem publicado ao longo dos anos obrigou os árbitros de elegâncias literárias a não ousarem colocá-lo no nicho dos autores regionaleiros, apesar do apetite manifestado por dois deles.
Esta obra, custosa na edificação debaixo de todos os signos, é marco importante na cultura portuguesa veiculando para toda a classe de públicos, significantes olvidados ou em via de desaparecimento da matricialidade linguística transmontana, logo obra de referência de primeiro plano nesta área do saber. Já a abri, mal a folheei, chocalhadas imagens de afectos, desacertos, júbilos, angústias, desastres, paixões, desaires, e outras cavanchonas do meu viver brotaram das saquitas da memória.
Imagino a profusão de lembranças que cada termo propiciou ao autor, arrisco a dizer: ganhou a dois carrinhos, por um lado enriqueceu tudo quanto concebeu desde o início da debulha, por outro repimpou-se de prazer a cada descoberta retirada da caverna de falares caídos na obscuridade.
Num País dominado pela espuma dos dias (não confundir com o livro surrealista) das telenovelas futebolísticas e políticas, e pelo aumento do cotão nos bolsos da maioria temo ante a possibilidade de parca venda dos dois tomos que dão corpo à Língua Charra.
Os professores de um modo geral ganham se a considerarem importante instrumento de trabalho, para os de português é mesmo imprescindível, os alunos a frequentarem o ensino superior em Trás-os-Montes se a consultarem a amiúde passam a perceber (melhor) o amado reino torguiano, todos nós também. Apesar da carestia reinante não admito a possibilidade de não figurar nas Bibliotecas escolares da província, dê lá por onde der. Não há escusas possíveis a tentarem justificar a falta.

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3448

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