A opinião de ...

A Cuidadania

1. Passar da cidadania à “cuidadania”, à luz dos acontecimentos que têm marcado o caminho da humanidade, desde março do pretérito ano até hoje, deveria ser um dos eixos principais a assumir, individual e coletivamente na nossa vida em sociedade.
Aprendemos, talvez da forma mais impressiva possível, pois de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente, com maior ou menor dor e sofrimento, espiritual e material, que ao modelo de sociedade do cada um por si, do salve-se quem puder, de guerreiros e conquistas, do êxito a todo o custo, urge uma alternativa vinculativa, entre uns e outros, para o estabelecimento maior de vínculos interpessoais, de cuidado uns dos outros e também da natureza e dos outros seres vivos.
Ser cidadão hoje é passar da condição da pessoa que, como membro de um Estado se acha no gozo de direitos que lhe permitem participar na vida desse mesmo Estado e também do desempenho dos deveres que, nessa condição, lhe são atribuídos, para uma pessoa que protagoniza a cultura do cuidado.
Cuidar de nós, cuidar de quem cuida de nós, cuidar de quem precisa de nós, sobretudo dos mais frágeis e fragilizados. Nunca como hoje valorizamos os Hospitais e o pessoal de saúde, as IPSS e os seus protagonistas, as Associações Humanitárias e as Forças de Segurança e mesmo as Escolas e a importância da Educação, não é?
Assim, talvez este seja um outro momento propício a que Sá Carneiro, há umas décadas atrás já aludia como desiderato, de aproveitarmos esta “oportunidade de construir um país novo, humano e justo. Não apenas um país para alguns”.
À luz do magistério do Papa Francisco, ainda recentemente evidenciada na sua Mensagem da Paz deste ano de 2021 ali víamos vertida esta categoria ética “para construir uma sociedade baseada nas relações de fraternidade”.
Neste sentido, mais uma vez volto a ela, pois tantas vezes menos lida, pouco conhecida e ainda menos apresentada, mesmo por quem dela deveria ser um apaixonado, a Doutrina Social da Igreja é a fonte que nos pode proporcionar um rico património de princípios, critérios e indicações dos quais se pode extrair uma possível “gramática” do cuidado: “a promoção da dignidade de toda a pessoa, a solidariedade para com os pobres e os indefesos, a preocupação com o bem comum e a salvaguarda da criação”.
2. “Não precisamos de muita coisa, só uns dos outros... e de sonhos”, dizia Oscar Wilde.
Assim tem sido os sonhos de quem como, nossos contemporâneos, Hirondino Fernandes, Armando Fernandes, António Pinelo Tiza, António Carneiro, Luís Canotilho, Amável Antão, Alex Rodrigues, Julieta Alves, Roberto Afonso, Isidro Rodrigues, Óscar Barros, Carlos Ferreira, Vítor Afonso, Óscar Barros, António José Vale, Fernando Tiza, Víctor Afonso, Romeu Fernandes, Manuel Cabral, António Fernandes, etc, com labor e dedicação, tem cuidado, pois isto também é cuidar, da memória e tradição, dos saberes e dos fazeres ancestrais, para que, em Trás-os-Montes continuem vivas e continuem a marcar profundamente uns e outros e este nosso território.
Tem sido assim, entre outras, com as máscaras, as festas, entre as quais o entrudo, os caretos, os contos e já agora também a dar as mãos deste património cultural à gastronomia, como o que sucede com a ação da Confraria do Butelo e da Casula que este ano assinala o seu 10.º aniversário!
Os transmontanos, podemos orgulhar-nos não só das nossas riquezas culturais, patrimoniais e identitárias, mas também destes cidadãos “cuidadores” que, empenhadamente, dão o seu prestimável contributo para as salvaguardar e até acrescentar.

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