A opinião de ...

Sócrates, Me Confesso…

Sábado, três da tarde, sol ameno. A árvore, ali mesmo defronte, abana-se ao mais leve sopro do vento que a acaricia. Já la vão uns vinte anos, meu sogro, Sr. Arnaldo, austero, a graciosidade de quem vai oferecer, arrancou uma franzina oliveira, podou-a com a ligeireza de quem sabe e disse: tome, leve-a para a Charneca da Caparica. E aqui está, risonha e companheira, sempre presente. A sombra que nos empresta, a todos que a procuram quando o calor desce e nos quer sufocar, é petisco de verão, sirvo-a juntamente com bebidas e outros mimos que arregalam a vista e descansam o estômago. É o meu anjo protetor.
Chegou a hora do confronto, comigo, com o que disse mil vezes, à exaustão, chateando e chateando-me, que o Governo de Sócrates foi um dos melhores da Democracia. Disse e mantenho.
Aqui, defronte do computador, aperto a memória, o passado que me persegue, por mais que me queira cercar, não me amedronta, sei que me isola, mas esse é o custo da coerência. A catarse, o expurgar, são formas de libertação do mal, não me revejo nessa amputação, só devemos justificações de pensamento, ao além. No entanto, quando questionado e porque o silêncio derrota, explica-se a razão pela qual.
Costumo dizer, a sério e não a brincar, que se um amigo, amigo mesmo, matar a mãe, irei vê-lo à prisão. Amigo é isso mesmo, o que lhe diria no cárcere ficaria nas trevas da intimidade. Dividamos, pura simplificação, a trajetória política da governação socrática, das potenciais ilicitudes criminais da sua atuação pessoal. Julgar Sócrates/EDP/BES/PT sem julgar BPN/Côrte Cavaquista é afronta nacional.
Intriga, convida à análise, franja social alargada abomina visceralmente Sócrates, razão haverá. Dissecando e uma vez que esse exército funciona por centúrias, por corporações, fácil intuir que César as beliscou, sabemos que ao de leve, mas foi ultraje inesquecível: professores, médicos, juízes, forças militares e militarizadas, enfermeiros jamais esquecerão a afronta, o retirar de direitos adquiridos, de elite, são rastilho ainda em queima.
O cancro das desigualdades, sempre em crescendo, está no despudorado acarinhamento dado às corporações em detrimento do gigantesco mundo laboral privado, aviltado desde o 25 de Abril. Sócrates enfrentou o polvo, e dele colheu a tinta que o marcou até hoje. Considero, sem dúvidas, que foram as únicas reformas estruturais da democracia, nenhum outro governo, até hoje, ousou esse confronto. Sem demérito dos outros os melhores Ministros da Educação, Saúde e Ciência, Lurdes Rodrigues, Correia de Campos e Mariano Gago serão para sempre orgulho socialista.
Mas é na aplicação das novas tecnologias ao serviço do povo português que Sócrates será lembrado: simplex, energias renováveis e informatização dos mais novos são carimbos no futuro.
E é aqui, junto a esta oliveira protetora que me transporto do passado para o futuro, sem vergonhas porque não renego: Sócrates, Me Confesso…

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