A opinião de ...

O erro

Recentemente, em cerimónia pública, na Gulbenkian, António Coutinho, dirigindo-se a galardoados africanos das novas Bolsas de Investigação, incentivava-os a prosseguirem os seus estudos e trabalhos sem receio de assumirem os seus erros, pois esse é o caminho certo de procura da verdade, fim último da atividade científica. Citava, a propósito, o primeiro princípio do Decálogo de Bertrand Russell “Não tenhas nunca a certeza absoluta de nada”, sendo que o segundo estipula “Não consideres que valha a pena proceder escondendo evidências, pois as evidências inevitavelmente virão à luz” o que, igualmente, releva para o caso em análise.
Acontece que, olhando para trás, tenho de reconhecer que na análise feita, há mais de um ano sobre a bondade e qualidade do monumento aos escritores, em Moncorvo, no Parque Verde Eng.º Aires Ferreira, Errei! O que ali está não é, seguramente, o mamarracho que ameaçava ser. Obviamente que o ajardinamento posterior e os melhoramentos, realizados pelos serviços camarários muito contribuíram para o alindar, dar valor, elegância e dignidade.
Tal não me desculpa pela minha falha que assumo e, da qual, me penitencio.
Aquele é, sem dúvida, um belo espaço de glorificação da cultura em geral e da literatura em particular. Não há razão para qualquer classificação menos elogiosa.
Errar é humano e não me sinto diminuído pela gafe. Pelo contrário, assumi-la, frontal, humilde e claramente confere-me autoridade moral para, elogiando a iniciativa, apontar-lhe um grande senão que, em boa verdade, se traduz em dois defeitos, embora o segundo seja de menor importância e que, penso eu, tenha resultado do primeiro.
São, a saber: uma falta inconcebível e um intruso injustificado.
Como é possível que, em Moncorvo, um monumento à literatura tenha excluído o maior escritor moncorvense de sempre, o homem que descreveu, como ninguém, a alma moncorvense, que enalteceu, de forma sublime, o Roboredo, que humanizou a nossa terra, que honrou o homem comum do nosso concelho, que descreveu a formosa Vilariça, na sua beleza e, igualmente, no drama secular ao mesmo tempo belo e aterrador do nosso “tsunami”, a Rebofa? Onde está o autor sensível, generoso, talentoso, livre e corajoso que os moncorvenses conhecem e que em devido tempo homenagearam e no qual se revêm com orgulho, satisfação e gratidão? Porque não foi colocado ali o busto de Abílio Adriano de Campos Monteiro?
Por outro lado o que faz ali Saramago? A que propósito? Que ligação especial tem com Moncorvo? Não está em causa a qualidade, valor e talento do autor, mas sim a verdadeira razão que o trouxe para junto dos inquestionáveis Torga e Borges... Homenagem a uma das maiores figuras das letras portuguesas? Pois bem. Outras haveria. Sem me alongar, cito alguns autores de incontestável valor com ligações conhecidas à capital do Douro Superior, como D. Dinis o poeta-rei, D. Luís de Portugal, homem culto protetor das artes e poeta renascentista ou, querendo subir ainda mais alto, porque não homenagear, na Terra do Ferro, o maior de todos, o imortal Luís Vaz de Camões que para além do génio superior teve, no seu tempo, forte ligação familiar à nossa terra.

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3904

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