A opinião de ...

Palácio das Açafatas

Reza a História a infeliz história de uma menina de descendência real. Nos idos anos de 1638 nasce em Vila Viçosa Catarina Henriqueta filha de El-Rei D. João IV e de D. Luísa de Gusmão. Por morte do pai em 1656 a Regente, sua mãe, casa D. Catarina de Bragança com Carlos II de Inglaterra. Nesse casamento em 1662, com apenas 24 anos, Catarina leva, como dote, os nossos Tânger e as ilhas de Bombaim.
Uma majestosa armada britânica transporta a princesa para os braços de um estroinado, arruaceiro, frequentador de bordeis de má fama, plantador de bastardos, marialva sem princípios, o Rei Carlos II de Inglaterra.
Por ser católica esta Rainha Consorte, em país anglicano, não pôde ser coroada, foi Rainha Consorte e sem Coroa, submetida a horrores perante uma corte implacável, obrigada a coabitar com as sucessivas amantes reais tendo sido, uma delas, a preferida do Rei, imposta como sua camareira-mor. Por infortúnio da natureza humana Catarina abortou três vezes não concedendo à coroa britânica qualquer descendência. Contam que naquele inferno só os afagos das mais chegadas damas de companhia a sustentavam.
Ficou escrito para os vindouros que esta mal-amada Rainha de Inglaterra deixou aos Ingleses, nobres e avançados costumes: geleia de laranja, five o`clock tea, tabaco e talheres.
Regressa, de vez, a Portugal, durante o reinado de D. Maria II em 1693, transportando todos os bens e haveres bem como as aias inglesas, seus queridos anjos-da-guarda.
Aqui chegada, completamente só e viúva, com reinado para esquecer, apenas procura a tranquilidade apostando na arte de bem receber dos portugueses que sempre transportou no coração. Por amável cedência da Corte de Portugal passou por três Palácios de dignidade majestática: o dos Condes de Redondo em Santa Marta (hoje Universidade Autónoma), o dos Condes de Soure no Bairro Alto (foi Teatro do Bairro Alto, já demolido) e o dos Condes de Aveiras em Belém (hoje Presidência da República).
Farta dos transtornos da acomodação do séquito real, ansiosa de recato e conforto íntimo e pessoal, resolve abraçar magnânima empreitada para construção de habitação própria, para si e para as damas de companhia: compra todos os terrenos do actual Jardim do Campo dos Mártires da Pátria, e toda a envolvente desde a Faculdade das Ciências Médicas até ao Campo de Santana e Bemposta. Emergem, com opulência, o Paço da Rainha no campo de Bemposta e para as suas queridas aias inglesas, um Palácio de conto de fadas, junto ao actual Hospital dos Capuchos, os dois palácios ligados em túnel (existem vestígios deste túnel).
Aquelas aias colocavam toda a roupa, brunida e passajada, da sua querida e infeliz rainha, em cestos de vime, baixos e retangulares, hoje tradicionais em todo o Portugal. E eis como um invulgar e utilitário cesto dá o nome ao Palácio das Açafatas…

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