A opinião de ...

Referendo da morte assistida

Não basta emprestar o ombro ao amigo, é necessário ser o ombro amigo.
Sexta-feira, 23 de outubro, a Assembleia da República “chumbou” um pedido de referendo de iniciativa popular, com mais de 95 mil assinaturas, sobre a despenalização da morte assistida, ou eutanásia. Votaram contra o PS, BE, PCP, PEV, PAN, 9 deputados do PSD, incluindo o seu líder, e mais duas deputadas não inscritas.
Para o Pe. Fernando Sampaio, coordenador do Grupo de Trabalho Inter-religioso (GTI) Religiões/Saúde, o chumbo é politicamente desastroso, pois o Serviço Nacional de Saúde [SNS] atravessa terríveis dificuldades e, há “gente a morrer sem cuidados de saúde”, não existindo uma “rede de cuidados paliativos nem continuados”.
Em que medida toda esta desvalorização dos 95 mil cidadãos proponentes do referendo, não se traduz mesmo num “orgulho exacerbado do poder”, por parte da classe política, como refere o Pe. Sampaio? Não será alheamento e, descompromisso com as reais necessidades das pessoas? Não haverá sobreposição dos aspetos económicos, sobre a justiça social? Ou, será mesmo uma tentativa de controlo da saúde, em benefício do poder político?
Limitar a justa autonomia do setor da saúde, ou “atacar os que se dedicam ao serviço dos membros sofredores do corpo social não beneficia a ninguém”, refere o Papa Francisco.
Mesmo que assistida a morte nunca é oportuna, nem tem cabimento arranjar um carrasco que a facilite. A vida de cada pessoa assume uma “dimensão sagrada inviolável e indisponível”.
Mas, vem aí a lei? A acontecer é um claro retrocesso civilizacional! Mas… O Papa Francisco dirigindo-se aos profissionais de saúde católicos lembra-lhes que se devem orientar “constantemente pela dignidade e a vida da pessoa, sem qualquer cedência a atos de natureza eutanásica, de suicídio assistido, ou supressão da vida, nem sequer se for irreversível o estado da doença”. Em certos casos, a estes profissionais, aconselha a objeção de consciência como “opção necessária”.
Um enquadramento humanista deve levar-nos a assumir sempre a defesa integral da vida humana. Amar sempre, cuidar, não abandonar as pessoas, para que estas não desistam de viver, na feliz expressão de Francisco.
Resta-nos o enorme desafio de “ajudar as pessoas a discernir e a olhar a vida de outra forma”, consciencializando-as dos seus direitos, acompanhando os mais frágeis, os doentes, porque quando se sentem amados eles só querem viver e, quando pedem a eutanásia é sinal que está a ser abandonado e descartado pelos cuidados”, refere o responsável do GTI.
Aquilo que nos dignifica não é proporcionar uma boa morte [eutanásia], mas assegurar uma boa vida e, isto exige fraternidade e, sentido de responsabilidade. Jesus diz que “não há maior amor do que o daquele que dá a vida pelos seus amigos”[Jo. 15, 13]. O Romano Pontífice prossegue: “quando se ama alguém, está-se ao seu lado, cuida-se, ajuda-se”. E, os médicos sob juramento de Hipócrates afirmam solenemente: “partilharei os meus conhecimentos médicos em benefício dos doentes e da melhoria dos cuidados de saúde; não os usarei para violar direitos humanos e liberdades civis, mesmo sob ameaça” [7].

Na salvaguarda, no respeito, na defesa, da vida humana desde o início até ao seu termo, como noutras causas, não basta emprestar o ombro ao amigo, é necessário ser o ombro amigo.

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3805

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