Política

Carlos Silvestre abandona Aliança e está disponível para novo projeto

Publicado por António G. Rodrigues em Qui, 2021-03-25 10:15

Carlos Silvestre já não é o representante distrital do Aliança, o partido fundado por Pedro Santana Lopes. O antigo guarda-redes e professor do ensino superior desvinculou-se do partido, depois de já anteriormente ter deixado o PS. Agora diz-se disponível para novos desafios, incluindo uma candidatura nas próximas eleições autárquicas.

 

Mensageiro de Bragança: Porque decidiu abandonar o Aliança?

Carlos Silvestre: Decidi abandonar o Aliança porque, principalmente, a partir das últimas eleições Legislativas onde fui cabeça de lista (e como sabe já tinha integrado a lista às Europeias, representando o nosso distrito), começaram a viver-se no partido algumas convulsões internas que se agudizaram (na minha opinião), nos últimos meses e que não estavam a condizer com aquilo que me tinha feito aceitar ser militante do Aliança.

 

Como é público, eu já tinha sido militante de outro partido (e permitam-me aqui um aparte, eu sou adepto daquela frase de um célebre político já falecido que dizia que “só não mudam os burros”) e mais uma vez aqui me acontece o mesmo. Ter de sair. E pelos vistos, saio deste partido, exatamente, pela mesma razão que saí do outro. Portanto, a culpa deve ser minha. Ou seja, eu, na minha vida, sou antes de mais muito autocrítico e gosto de analisar tudo e ver o que eu fiz ou faço de errado e também como posso ajudar a mudar as coisas. E também aqui o fiz. Tentei perceber o que se passou e o que é que tinha, mais uma vez feito, para que este desfecho de sair de um partido não se repetisse. Percebi outra vez que, quando as pessoas que representam os partidos não compreendem que estar num partido político é estar ao serviço das pessoas do seu país, então eu, que não consigo ser hipócrita em nada, não podia continuar a coabitar com isso. Tenho a consciência tranquila e provas de que tentei durante alguns meses, dentro do partido e com a frontalidade, a lisura e a lealdade que quem me conhece sabe que defendo, apelar para os valores e para os princípios basilares e fundacionais que o mesmo preconiza nos seus estatutos. Foi, aliás, por causa desses princípios e por acreditar neles que aceitei ser militante. Gostava de salientar aqui esses princípios que são: as Pessoas, a Solidariedade e a Liberdade (PSL). Aliás, estes princípios são aqueles que sempre estiveram e espero que continuem a estar presentes na minha vida, e são para mim os princípios essenciais que devem preocupar todos os que governam ou estão responsáveis, seja pelo que for. Foi, portanto, por estes princípios que sempre lutei e continuarei a lutar toda a minha vida. Isto, porque tenho a certeza de que sem Pessoas, não há vida, sem Solidariedade entre as pessoas não há relação, e pessoas sem Liberdade não existem, e, portanto, sem existência não há vida, não há pessoas e por isso de que interessa o Mundo?

 

Neste sentido, o que quero salientar com isto é que quando os partidos começam a lutar por lados (esquerda vs direita e vice-versa) e não pelas pessoas na sua essência e sejam elas quais forem, então eu já não me revejo. E, assim, quando o discurso começou a ficar muito focado nisto e a perder o fundamental da criação do partido, e de eu ter percebido que não iria nunca conseguir passar a verdadeira mensagem que tinha levado à fundação do partido (acredito eu), das Pessoas, da Solidariedade e da Liberdade, decidi que era a hora de sair, facto que ficou mais fácil quando o seu mentor e fundador, o Dr. Pedro Santana Lopes (PSL) saiu também.

 

MDB.: O que falhou no projeto?

CS.: Falhou, mais uma vez, aquilo que, para mim, é fundamental e estruturante em toda a existência do ser humano e em tudo aquilo que o ser humano é e tem de ser: a Educação. Neste caso em concreto, refiro-me à educação e à cultura política que o nosso país não tem e não quer ter e por isso não promove e não desenvolve desde a mais tenra idade possível (deixo a dica para que sejam os peritos a propor essa idade), no seu meio privilegiado: a Escola.

 

Para mim, o maior problema de um país é a não aposta na Educação do seu povo. Quem governar um país e não perceber que enquanto não existir uma verdadeira e desmesurada aposta na Educação do povo, nas suas plurimultifacetadas áreas possíveis ou imaginárias, esse povo nunca será competitivo nem terá sucesso em nenhuma área. Ou seja, também na área política é necessário e urgente promover uma educação e cultura política livre e isenta de cargas partidárias, precisamente para evitar aquilo que neste projecto que abracei, pelo menos, para mim, correu mal. Isto é, mais uma vez aqui apareceram pessoas que legitimamente (aceito), acham que o que está em causa nas sociedades (em particular na portuguesa), é uma visão partidária de direita vs esquerda. Ora, o conceito de política e de político não é isso que diz. E, em Portugal, ao longo da história e mais particularmente no pós século 19 temos visto que a política e o ser político é algo que, infelizmente, se centra e gira à volta do umbigo daqueles que estão com e no poder e que quando os outros que não estão, conseguem lá chegar o que fazem é “vingar-se” das políticas e dos políticos anteriores, esquecendo-se eles que no meio dessas vinganças está um povo que, por falta da tal educação que os políticos não promovem, sofrem a bom sofrer. E tem sido isto que nos últimos 46 anos se vem a agudizar e que me faz dizer que a diferença entre a esquerda e a direita, ou melhor nestes últimos 46 anos a diferença entre o PS e o PSD é o D. Aliás, vou mais longe e digo que a falta de educação e cultura política do nosso povo permite que estes 2 partidos, por exemplo, tenham esta hegemonia e “controlem” todo o sistema, tipo “pescadinha de rabo na boca” levando à sua perpetuação alternada no poder e que me faz dizer, mais brejeiramente, e à boa moda transmontana, que um poste com um destes símbolos pendurado, arrisca-se a ganhar uma eleição. Há, portanto, muito a fazer se os alegados DDT e que vão tendo responsabilidades governativas (de ambos os lados), assim o quiserem alterar.

 

Daí que, para mim, este projeto, falhou quando comecei a ver que a preocupação era o ter de se estar num lado político e não ter de se estar pelo lado das pessoas. Mas atenção, volto a dizer que o que falha aqui é não haver uma verdadeira educação e cultura política que faça com que as pessoas não embarquem em discursos de esquerda contra direita ou vice-versa (e, pior, quando agora se extremam os lados), pois o mais importante é que os políticos (político significa servir o outro), sirvam na realidade o outro e não se sirvam a eles próprios. Resumindo, este e todos os projetos políticos em Portugal falham e falharão, pela mesma razão que falham e falharão na generalidade, o resto das áreas e projetos neste país. A falta de uma Educação séria e responsável vocacionada para o desenvolvimento integrado e sustentado das pessoas e das coisas é a grande causa dos falhanços de Portugal. Um povo educado é um povo desenvolvido.

 

MDB.: Que projetos tem para o futuro?

CS.: Os meus projetos para o futuro continuarão a ser simples e objetivos. Continuarei a ser aquilo que fui até hoje e sempre a dar voz e a lutar pelos mais desfavorecidos. Continuarei a ser uma pessoa preocupada com a minha casa, com o meu prédio, com a minha rua, com o meu bairro, com a minha aldeia, com a minha vila, com a minha cidade, com o meu concelho, com o meu distrito, com a minha região, com o meu país, enfim com o mundo em geral e com as pessoas em particular que ele encerra e que habitam os espaços que foquei, pois, como digo, sem pessoas de que interessa o mundo?

 

MDB.: Uma candidatura autárquica está fora de questão? Como independente ou com um partido?

CS.: Bom, como referi até agora, a minha preocupação maior são e serão sempre as pessoas. Todas as pessoas. Se eu acreditar que tenho mais possibilidades de ajudar as pessoas e servi-las melhor, através de uma candidatura autárquica, então digo-lhe que uma candidatura autárquica não está de todo fora de questão. Quem me conhece sabe que eu me sinto muito melhor e mais pessoa quando posso contribuir para ajudar a minimizar o sofrimento das pessoas. De todas as pessoas. Acredite que quando posso ser útil a alguém ou tornar a vida melhor e mais fácil e justa para alguém sinto uma sensação indescritível.

 

Portanto, não escondo que para fazer mais e melhor gostava de ter mais possibilidades disso. Estar numa autarquia, que é ou deve ser por excelência o local de maior proximidade e apoio à população que serve, permitir-me-ia sem dúvida cumprir este meu desígnio enquanto pessoa: ajudar e ser útil ao próximo. Quanto ao facto de ser como independente ou com um partido, para mim, tanto faz. Uma coisa é certa, a acontecer será sempre como independente e com o sentido nas pessoas que possa servir, isto é, não está na minha cabeça voltar a ser militante de nenhum partido (mesmo sendo adepto daquele pensamento do “só não mudam os burros” que já citei atrás). Agora, tenho a noção que se a lei autárquica não for re-alterada e voltar a permitir candidaturas de cidadãos como acontecia até aqui, será muito difícil conseguir uma candidatura desse género.

 

MDB.: Como vê o surgimento destes novos partidos, como o Aliança, Iniciativa Liberal ou o Chega?

CS.: Eu vejo com bons olhos o aparecimento de novos partidos e de muitos partidos, pois isso é o que nos traz democracia e liberdade. Sabe a liberdade é outro pilar que como já disse estava consignada nos estatutos do Aliança. A falta de liberdade é algo que me preocupa imenso e ver laivos dessa perda está a preocupar-me. Quem viveu em ditadura sabe o que eu estou a dizer. Eu tinha 10 anos quando saímos da ditadura e acredite que já tinha cabeça para perceber o que era a falta de liberdade. Um dia contarei essas memórias de miúdo.

 

Portanto, o aparecimento destes novos partidos e de outros que surjam são bem-vindos. Porém, e como já disse, é preciso investir urgentemente na educação e cultura política do nosso povo de forma a que as pessoas sejam capazes de, por si só, perceberem e descodificarem os discursos, as ideologias, as mensagens subliminares e as vontades de cada partido, de cada político e o mais grave de tudo, daquilo que é hoje a sociedade de informação (desinformação), em que vivemos, nomeadamente, através de alguma comunicação social e das redes sociais que inundam todos os dias as cabeças das pessoas com informação e contra-infiormação, vulgo fake news.

 

Se o nosso país (e deixo o desafio a estes novos partidos), não mudarem este paradigma existente, de corrupção e de alegado enriquecimento dos políticos, para um paradigma assente na promoção de uma educação e cultura política das pessoas, mostrando que não têm medo de as educar… então Portugal irá sofrer muito, haverá muita convulsão social e continuará a cair para a cauda da Europa e do mundo. Por isso, força a todos aqueles que andam neste mundo por bem e que verdadeiramente acreditam que podem fazer alguma coisa para ajudar o mundo a ser melhor.

Assinaturas MDB