A opinião de ...

No Alentejo como em Bragança

A declaração da cerca sanitária em duas freguesias do concelho de Odemira por causa do indicador de gravidade em relação à proliferação do Covid 19 se encontrar no vermelho mais aceso, trouxe para a ordem do dia a discussão sobre a exploração de imigrantes, o que já é grave, mas também sobre o tráfico de seres humanos (TSH), crime mais grave e que nos traz à memória a escravatura moderna, que nos envergonha como sociedade evoluída e respeitadora da dignidade da pessoa. É a ganância material a sobrepor-se à humanidade.

Apesar de o problema ser do domínio público há vários anos, com denúncias formais e processos judiciais em curso, ficámos estupefactos ao tomar conhecimento da real dimensão do problema. Cerca de 20.000 imigrantes no Alentejo. Muitos ilegais, instalados em alojamentos sem quaisquer condições sanitárias e de habitabilidade, superlotados, a ganhar uma miséria que mal dá para se alimentarem quanto mais para uma vida condigna. A propagação do vírus não podia ter melhor terreno. Como se isso não bastasse, estão subjugados a redes de tráfico de pessoas que os exploram desde a saída dos seus países. obram-lhes comissões chorudas, de vários milhares de euros, para os trazer desde a suas terra, com promessas de trabalho e recompensa sérios e depois ficam sujeitos a uma exploração da qual não se conseguem ver livres. Onde é que eu já vi este filme? Já alguém esqueceu o caso das discotecas de Bragança do início do sec. XXI? Basta passar na Avenida Sá Carneiro e olhar para o Monte de S. Bartolomeu e vem tudo à memória. A principal diferença era que em Bragança as vítimas eram sobretudo mulheres, jovens e bonitas, obrigadas e prostituir-se, por uma rede organizada de exploradores das casas noturnas. Agora, as vítimas são jovens adultos homens, com origem asiática., de todo o Alentejo. Ficam sujeitos a empresas de trabalho temporário formadas pelas redes de traficantes e angariadores, naturais de países de leste, que também já foram explorados. São obrigados a trabalhar nas explorações agrícolas, estufas de Odemira, nos extensos olivais, amendoais e vinhas de todo o Alentejo, conforme as necessidades e época do ano.

O SEF, que é ainda a polícia de estrangeiros com responsabilidades de viabilizar uma política correta de migração e garantir a sua eficaz execução, informou a imprensa ter em curso 32 inquéritos criminais, instaurados nos últimos anos, não tem sido eficaz na sua missão de investigar o crime de auxílio à imigração ilegal e de mão de obra ilegal, apresentar à justiça os seus autores com provas bastantes para condenações. Já a Polícia Judiciária, como corpo superior de polícia criminal, dotado de particular especialização técnica e científica, com competência exclusiva na investigação do crime TSH, tem sido inoperante mas diz estar muito atenta a este tema específico. Isso não chega. A eficácia da investigação exige mais ação.

É claro que a execução de uma correta política de migração, com total respeito dos seus direitos, não é um problema de polícia mas do Estado, cujas instituições têm que trabalhar em rede de inteligência colaborativa para uma política social de acolhimento e integração mais humana.

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