A opinião de ...

Mons. José de Castro

Há dias encontrei num alfarrabista lisboeta o opúsculo titulado Elogio de Mons. José de Castro, dado à estampa em 1969 pela Academia Portuguesa da História. Trata-se do relato da sessão de dois de Dezembro do ano anterior, na qual o Marquês de São-Paio fez o elogio do seu antecessor na cadeira académica.
Adquiri o documento por duas razões, a primeira de interesse intelectual, a segunda porque a Irmã do ilustre historiador, minha professora – a Dona Aninhas Castro – nos intervalos explicativos do programa da quarta-classe falava embevecida do seu Irmão não se furtando a contar episódios picarescos da vida dele, especialmente durante os catorze anos de exílio no Brasil.
O padre José de Castro exilou-se na sequência da sua prisão acusado de ter transmitido informações aos couceiristas aquando da incursão de Paiva Couceiro em terras transmontanas no intuito de restaurar a monarquia. Na altura o jovem sacerdote era pároco em Gimonde, o ser monárquico segundo a Dona Aninhas provinha da família, embora o seu padrinho fosse republicano, democrata.
Em 1930, o futuro historiador é nomeado pelo governo para ocupar o lugar de consultor eclesiástico da nossa então Legação em Roma, aí depressa se tornou notado dado preferir a aridez dos documentos existentes no sumptuoso Arquivo do Vaticano às mundanidades do dia ao dia diplomático.
Alguns historiadores de ontem e hoje teimam em não concederam H grande de Historiador a Monsenhor José de Castro, no meu modesto entender porque só folhearam a sua obra, ou então devido a preconceitos ciumentos porque ele teve a possibilidade de compulsar e estudar documentação inacessível a leigos, a ignorantes do domínio da língua latina, a não residentes ou visitantes prolongados da cidade-eterna.
Pode-se não concordar com as suas teses sobre Dom Sebastião, o Cardeal Dom Henrique e o Prior do Crato, mas não se lhe pode assacar falta de traquejo no uso das ferramentas de investigação histórica. Os seus trabalhos sobre Dom Frei Bartolomeu dos Mártires e Portugal no Concílio de Trento não podem ser ignorados por todos quantos se dedicam a estudar matérias consignadas ao rigoroso Prelado que tanto se distinguiu no polémico concílio a originar volumosa obra da sua autoria.
Seria bizarro não referir a minuciosa obra da sua autoria relativa à Diocese de Bragança-Miranda, é farta no fornecimento de elementos referentes à sua criação e evolução, é forte nos travejamentos documentais as sustentarem as afirmações e fundamental para melhor entendermos a estrutura social ao longo dos séculos.
As obras e a personalidade deste estudioso são activos culturais que a cidade (Autarquia, Arquivos, Bibliotecas, Escolas, Instituto Politécnico, Museus) devia enaltecer. Como? De variadas formas, peço escusa de as referir, os mediadores científicos e culturais têm a obrigação de saber como.
Ao meu amigo Eleutério Alves, peço o favor de equacionar a possibilidade de ser reeditada o trabalho de José de Castro relativo à Santa Casa de Bragança, da qual é animoso Provedor. Seria rutilante obra de misericórdia cultural a sua volta aos escaparates.
Armando Fernandes
PS. O futuro da Europa belisca-nos a todos, atrevo-me a sugerir aos atentos a leitura do «clássico estudo» de Paul Hazard, A Crise da Consciência Europeia. O proveito é grande.

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3579

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