50 anos de «Abril»: balanço social II.II.3. Saúde
A saúde é, para nós, a terceira função social mais importante no Estado Democrático, depois da Economia e da Justiça.
O Estado assegura esta função social através de serviços do Estado, de serviços privados convencionados ou não com o Estado, e de serviços do sector social (pessoas colectivas de apoio social, misericórdias e Igrejas), também convencionados com o Estado.
Estes três tipos de serviços constituem o Serviço Nacional de Saúde que, dentro de cada tipo, ainda se subdivide em serviços primários e de saúde pública (centros de saúde) e serviços hospitalares especializados (hospitais).
O Serviço Nacional de Saúde foi criado em 1971 pelo IV Governo do Estado Novo, presidido por Marcelo Caetano (decretos-lei nº 413, de 27 de Setembro, reconhecendo o direito de todos os portugueses à saúde, e nº 414, dos mesmos dia e mês, «que estabelece o regime legal que permitirá a estruturação progressiva e o funcionamento regular de carreiras profissionais para os diversos grupos diferenciados de funcionários que prestam serviço no Ministério da Saúde e Assistência.»1 Porém, a criação de um Ministério da Saúde, autónomo da Assistência Social só ocorrerá em 6 de Novembro de 1973, através do Decreto-Lei n.º 584/73, para logo se retroceder, em 1974, transformando o Ministério em Secretaria de Estado (da Saúde), integrada no Ministério dos Assuntos Sociais pelo Decreto-Lei n.º 203/74, de 15 de Maio, (I Governo Provisório pós-25 de Abril de 1974).
A Constituição de 1976 determina no seu artigo 64º que o direito à saúde é universal e incumbe ao Estado garanti-lo. Na sequência, o «Despacho Arnaut», do II Governo Constitucional, concretizou este direito universal e gratuito, independentemente da capacidade retributiva dos cidadãos, e a Lei 56, de 15/9/79, confirma definitivamente o SNS como organização autónoma do MAS.
Como ministério autónomo, o da Saúde, existe desde 25 de Julho de 1983 (Decreto-Lei n.º 344-A): «A autonomia é ditada pela importância do sector, pelo volume dos serviços, pelas infra-estruturas que integra e pela importância que os cidadãos lhe reconhecem» 2.
O SNS é hoje o segundo serviço mais financiado pelo Estado com mais de 15 mil milhões de euros anuais. Tornou-se demasiado grande para ser flexível e demasiado complexo para suportar regras universais. Encontra-se numa encruzilhada entre a eficiência (gestão racional e auto-sustentável dos recursos) e a eficácia (alcance dos objectivos sociais ou satisfação dos utentes).
Sendo um dos bens maiores desenvolvidos no pós-25 de Abril, tal como a Segurança Social e a Educação, o SNS é prisioneiro de interesses vários entrecruzados ao nível da decisão política e da decisão institucional, sofrendo de pouca racionalidade na gestão e nos processos organizativos, atravessados por lutas corporativas profissionais, tanto com a Tutela como entre corporações ao ponto de já não se saber se quem manda são os médicos / técnicos ou os enfermeiros.
Tudo isto parece ser resultado da crise de crescimento que o SNS, felizmente, teve, sem se procurar a organização adequada, vítima de vários interesses em conflito.
De qualquer forma, o SNS é uma bandeira da democracia, uma bandeira com as quinas bem vivas.
1 https://www.historico.portugal.gov.pt/pt/o-governo/arquivo-historico/go…
2 Idem, ibidem