50 anos de Abril: II.4. Balanço político – síntese
Houve sucessos, insucessos e, até, retrocessos.
Começarei por dizer que o «Projecto de Abril» é bem conseguido. A Constituição de 1976 é um texto heterogéneo que reflecte o conflito entre os espíritos revolucionário comunista e de extrema-esquerda, de um lado, - que não estava presente no Programa Inicial do MFA -, e os espíritos social-democrata do PS e do PPD e o espírito liberal democrata cristão de parte do PPD e do CDS.
Existe uma grande coerência entre o Programa do MFA, a revisão Constitucional de 1982, na parte da devolução do Poder à Sociedade Civil, e a revisão constitucional de 1989, o que significa que a Tutela Militar cumpriu o seu Projecto e deu autonomia à classe Política, em 1982. A revisão constitucional de 1989 abriu caminho ao projeto liberal de sociedade e de economia, também pela entrada de Portugal na CEE (Comunidade Económica Europeia.
No período revolucionário também houve aquisições. A Constituição de 1976 e as revisões de 1982, 1997, 2004 e 2005 consagram direitos e garantias que não estavam previstos no Programa do MFA: a autonomia e consolidação do Poder Local e os direitos propostos pelo Liberalismo (Poder Local, Regionalização, descentralização e coesão territorial) e pela Nova Esquerda (participação, directa e indirecta; petição popular; referendo, nacional e local; igualdade de género; direito à diferença; novas conceções de família; e igualdade social através de discriminações positivas várias, subordinadas ao princípio da equidade e da proporcionalidade. A revisão Constitucional de 1997 aprofundou a participação política dos cidadãos mediante a petição popular e a de 2004 aprofundou a autonomia das regiões autónomas.
Portugal soube construir uma democracia pluralista cujo Poder Político é baseado no sufrágio directo e universal e nas liberdades políticas e cívicas mas não conseguiu democratizar a Administração Pública. Deu passos importantes na governação electrónica e nas energias renováveis mas combateu pouco a infoexclusão.
A integração de Portugal nos vários areópagos democráticos ocidentais bem como a ratificação da Declaração Universal dos Direitos do Homem evidenciam a aceitação internacional de Portugal como país democrático, com preocupações sociais.
Conto 10 insucessos maiores: 1) a excessiva centralização e manutenção do carácter discricionário, arbitrário, fechado e pouco transparente das administrações pública e privada; 2) o desleixo face aos problemas demográficos do país e face aos problemas da integração dos jovens no mercado do trabalho com perda grave de dinâmicas demográficas reprodutivas; 3) a irresponsabilidade dos decisores políticos em múltiplas vertentes, com orientação exclusiva para o voto; 4) a desvalorização de critérios de sucesso e de mérito na educação como «elevador social»; 5) o incremento da burocracia como sistema protector do Poder Legal, eximido à prestação de contas; 6) a redução da dimensão participativa-social da democracia; 7) a pouca consideração de políticas ambientais positivas; 8) a pouca valorização da integração racial, multicultural e multiétnica e, em geral, da integração social das diferenças; 9) a pouca consideração dos problemas habitacionais; 10) a pouca consideração da responsabilização social como estratégia para a cidadania activa, participante e reivindicativa.
(Continua: II.II. 50 anos de Abril - balanço social. II.II.1. Economia)