A opinião de ...

ASSUNTO:–“USUCAPIÃO-LEGALIZAÇÃO DE BENS HERDADOS”

QUESTÃO:-“…o meu pai faleceu há mais de 24 anos. A minha mãe ainda é viva. Ainda não fizemos partilhas oficiais. Os bens que me tocaram posso registá-los no Notário, por usucapião?”

RESPOSTA - (elaborada em 22/02/21) - O nosso artigo publicado na edição n.º 3805 de 29/10/20, do “Mensageiro de Bragança” sobre a figura jurídica da “Usucapião”, acabou por despoletar algumas situações que estavam “arrumadas no armário”, as quais nos foram chegando em termos verbais e, também por escrito, tal como acontece com a que o nosso estimado assinante nos apresenta.

Sintetizando a figura jurídica da “Usucapião”, diremos que se trata de um processo simples, não obstante as suas próprias especificidades para cada situação em análise.
O Código Civil através dos artigos 1287.º a 1299.º estabelece determinadas regras para que possamos invocar a figura da Usucapião, constatando-se que “a posse do direito de propriedade ou outros direitos reais de gozo, mantido por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposições em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação”.

Na questão apresentada, diremos que em termos oficiais, os bens imóveis em causa pertencem a uma herança indivisa, logo, é necessário proceder à tramitação estabelecida por Lei para que os bens que fazem parte da herança sejam partilhados e registados em nome de cada herdeiro. É que, havendo mais do que um herdeiro, a herança antes de partilhada pertence em comum a todos os herdeiros, não se podendo afirmar que determinado bem em concreto pertence a um dos herdeiros.
Considerando que na situação exposta diz-se que não foram feitas partilhas oficiais, infere-se consequentemente, que as mesmas foram efetuadas em termos verbais, particularmente entre os herdeiros. Assim sendo, é necessário proceder a algumas formalidades para que tudo esteja em conformidade com o que legalmente se encontra estabelecido.
Partindo do pressuposto que aquando do falecimento do autor da herança, o cabeça de casal participou o óbito aos Serviços de Finanças respetivo, cumprindo consequentemente também as restantes formalidades, nomeadamente a relação dos bens imóveis da herança, é necessário proceder às tramitações que de seguida se descrevem.
Para que os bens que ao tempo foram partilhados amigavelmente, conforme indica na questão apresentada, torna-se agora necessário proceder à “Habilitação de Herdeiros”, caso ainda não tenha sido feita, para formalizar o acordo verbal, considerando que há mais do que um herdeiro.
A escritura de “Habilitação de Herdeiros” consiste num documento a ser elaborado no Cartório Notarial, com a indicação de quem são os herdeiros, bem como da respetiva apresentação da certidão de óbito, ou seja, é obrigatório proceder à escritura notarial de “Habilitação de Herdeiros” por óbito do autor da herança para se proceder à “Partilha dos Bens”.
Seguidamente parte-se para a partilha dos bens. Se houver consenso entre os herdeiros, como será o caso, a partilha deve fazer-se através de escritura notarial, ficando desde logo os bens a que cada um couber, devidamente registados nos Serviços de Finanças e Conservatória do Registo Predial no respetivo nome.
Na eventualidade de algum herdeiro não concordar com a partilha amigável dos bens, procede-se à abertura de um Processo de Inventário, o qual também pode ser requerido pelo Ministério Público quando existam herdeiros menores. Nestas circunstâncias é ao Tribunal que compete homologar a partilha.

Face ao descrito, infere-se que a “Usucapião” não é aplicável à questão exposta, uma vez que esta figura jurídica, só se aplica quando não haja título (escritura ou sentença do Tribunal), ou quando este não seja possível obter. No caso em apreço o título é possível: Habilitação de Herdeiros e Partilha, considerando que os bens se transitaram para a esfera patrimonial através de uma transmissão gratuita, nomeadamente por falecimento do autor da herança.

Edição
3821

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