A opinião de ...

Lutas…chegas e... …ambiguidades!...

Longe vão os tempos em que o quotidiano do mundo rural proporcionava inúmeras experiências e acontecimentos que, agora, apenas fazem parte do baú das nossas memórias.
Refiro-me às décadas de 60/70, do século passado, durante as quais vivi a minha meninice, infância e adolescência. Era tudo tão diferente!... Mas uma coisa importante não faltava, era alegria na “gente”!... Tanta história, tanta aventura para contar …
Bom, mas o que me apetece recordar hoje, é a envolvência inerente à ida dos bovinos para os lameiros, ou como se dizia, ir com as vacas para o lameiro.
Pois, apesar de não ser muito do meu agrado, ainda em criança, fui, também, guardador de vacas, de machos. E lá ia eu para o lameiro, às vezes, longe da aldeia. No verão, levantar-me ao nascer o dia, era coisa que me agradava pouco. Mas, não podia dizer que não!... Era só o que faltava. Ainda me recordo quando passava as manhãs a ver luta entre formigas de formigueiros diferentes!... Sim, porque as formigas também lutam, e com arreganho!
No regresso à loja, ou ao curral, após o período de pasto nos lameiros, era frequente os bovinos da aldeia encontrarem-se na ribeira, para beberem. E de forma natural, sem nada combinado, obviamente, despontavam lutas entre estes animais, nomeadamente entre os vitelos já crescidos, ou nos touros.
Assistia-se, com efeito a duelos interessantes, espontâneos, vivos e sadios, no contexto do instinto animal e da sobrevivência sobre liderança.
Não havia nada combinado, nem os espetadores estavam à espera que o espectáculo acontecesse. Tudo eram, absolutamente, natural.
Hoje, tudo mudou, tudo acontece de maneira diferente. Outros tempos, outras formas de pensar e viver.
Agora, as lutas, a chegas, são programadas, até em forma de campeonato. Com palcos construídos (quem diria, há uns anos atrás!...) para o efeito, sendo selecionados os touros, que parecem ter mais força e jeito. Até apostas se fazem. Movimenta-se dinheiro.
No passado dia 14 de Setembro, domingo, realizaram-se as tradicionais lutas de touros, integradas nas festividades do Divino Senhor dos Chãos. Forasteiros, aos milhares!... Não admira, até pela religiosidade e pela centralidade do complexo do santuário. Animação não faltava. Tudo devidamente combinado. E os animais lá foram, dois a dois, colocados no recinto. Contudo, a disposição para brindar os aficionados atentos e entusiasmados, parecia pouca, por parte dos protagonistas, os touros, claro está. Afinal, os animais também vão aprendendo a lidar uns com os outros, respeitando-se mutuamente, independentemente da vontade dos homens.
Se o objetivo era presenciar lutas renhidas e entusiasmantes, os intervenientes não estavam a corresponder, até à altura em que entraram em cena, dois bonitos touros, por sinal do mesmo proprietário. E, de facto, até proporcionavam uma luta agradável, leal, entre os ambos.
Só que, porque já durava mais de meia hora, e por isso, por sermos eternos insatisfeitos, resolveram separar os bichos, sem que fosse encontrado o vencedor. O que não parece ter agradado aos dóceis touros, nem a muitas das pessoas presentes. E o desconforto foi manifestado por um deles, que acabou por derrubar e magoar um dos tratadores. Consequências admissíveis, portanto.
O que eu não percebi foi, não só o comportamento de quem se manifestou a favor do fim desta luta, quando os animais evidenciavam relativa recreação, como dos responsáveis pela mesma!...
Afinal, qual é o objetivo das chegas de touros, não é vê-los lutar?!...
Se é, porque foi sugerido e concretizado o fim forçado de uma luta?!..
Vamos lá perceber o mundo!... Enfim, ambiguidades…de pensamento e comportamento!..

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