Ex-votos
A gratidão, nas tabuinhas pintadas e, nas figuras de cera
O Museu Abade de Baçal tem patente até ao dia 29 de setembro a exposição: ”Segundo uma promessa – Ex-votos na Diocese de Bragança-Miranda”. Muitas destas peças estão inventariadas no livro, já esgotado, do Cónego Belarmino Afonso: “Ex-votos e religiosidade popular no distrito de Bragança”, de 1995, outras são peças dadas a conhecer ao grande público pela primeira vez. A exposição combina ex-votos e escultura sacra, provenientes de várias igrejas da cidade e da diocese.
Ao longo da história muitos fiéis, atravessados por experiências de grande dor, ou desespero, intensificam o seu diálogo com Deus, a Virgem Maria e os santos, agradecidos pelo dom concedido deixando nos santuários, ermidas, ou capelas, pequenos quadrinhos, a maior parte das vezes pintados por artistas ingénuos, com pequenas frases que traduzem o sucedido, ou ainda objetos ortopédicos, estatuetas do corpo humano, órgãos internos, ou partes externas, em cera [pés, mãos, cabeças, cabeleiras…], como expressão de fé e gratidão pelo benefício alcançado.
Às tabuinhas pintadas, dos séculos XVIII e XIX, impuseram-se, pela massificação industrial, efémeras e desenxabidas figuras de cera e objetos perecíveis. Não significa que hoje não haja curas, factos extraordinários, e muita gente a agradecer, pelo contrário as capelas, ermidas e santuários, embatucam com as ceras de baixo custo, ou não atravessássemos tempos de liquidações, de baixa magnanimidade e, pouca fidalguia tanto no trato artístico, como na relação humano-divino.
Mas, voltando aos ex-votos eram também eles oferendas que os gentios faziam aos seus deuses. O voto significa também jóia, ou insígnia oferecida a Deus, ou a algum santo como forma de agradecimento por algum benefício recebido, ou a tábua, ou a tela, em que se expressa o mesmo benefício, do Lat. “res ex voto Deo dicata” [coisa dedicada a Deus, por dom].
A Igreja Católica, no Código de Direito Canónico [CIC] de 1917 fala do ex-voto ao tratar do «voto real» [c. 1308 § 4], que um pouco mais tarde equiparará a bem precioso, que requer autorização apostólica para poder ser alienado [cf. CIC 1917, c. 1532], mesmo que o doador consinta de bom grado nessa alienação. A mera oferenda do objeto ao altar, ou à imagem sagrada, supõem a presunção do voto, a não ser que conste a vontade contrária do doador.
O CIC de 1983 apresenta o ex-voto com uma nova roupagem, fala de um bem precioso que requer autorização da Santa Sé para alienação, mas acrescenta-lhe a dimensão cultural e pastoral. Este bem precioso inscreve-se agora nos capítulos da «missão de santificar» dos santuários e, no da «administração dos bens temporais da Igreja»: «Nos santuários, ou nos lugares adjacentes, conserve-se visivelmente e guarde-se em segurança os ex-votos de arte popular e de piedade [c. 1234 § 2]. No caso de alienação, tratando-se de «ex-votos» doados à Igreja, ou de bens preciosos por razões artísticas, ou históricas, requer-se para a validade da alienação também licença da Santa Sé [c. 1292 § 2] [2]. (TERRIZA, Ex-voto, 2012, 882)