A opinião de ...

O Risco e o Medo

No início de 2018, precisamente dois anos antes da declaração da Pandemia Covid19 pela OMS, foi publicado o livro FACTFULNESS escrito pelo médico sueco Hans Rosling (falecido em 2017), em co-autoria com o seu filho Ola Rosling e a sua nora Anna Rosling Rönnlund. A partir da Base de Dados, elaborada pelo trio através da Fundação Gapminder, o consultor e especialista em Saúde e Desenvolvimento disserta sobre a atualidade e sobre o futuro próximo, tanto quanto é possível prever, com alguma certeza. Otimista quanto ao trajeto ascendente dos níveis sanitários e económicos mundiais, aponta, contudo, alguns riscos globais e, de entre todos, faz especial referência a cinco, por esta ordem: Pandemia global; Colapso Financeiro; Terceira Guerra Mundial; Alterações Climáticas e Pobreza Extrema.
Obviamente que o autor não podia imaginar quão perto estávamos de enfrentar a primeira nem como a segunda, por causa dessa, rondou o mundo inteiro, confinado e obrigado a ter de escolher entre a Saúde e a Economia. Curiosamente um dos que mais o preocupava e que, embora lhe causasse muitos receios, as Alterações Climáticas, sofreram um impulso positivo, relevante, mesmo que provisoriamente. Já no que toca à Pobreza, a trajetória ascendente, no bom caminho, sofreu um revés pois foi aos mais fracos, mais indefesos e mais desprotegidos que a calamidade mais afetou, direta e indiretamente.
Tal como com a pandemia, embora de forma menos evidente, também no progresso mundial, o destino comum depende de todos. O bem estar dos outros contribui positivamente para o nosso bem estar. Por isso mesmo a defesa e promoção do bem público é de interesse comum e não pode ser prejudicada pelos interesses pessoais que não sejam legítimos. Infelizmente esse é também um risco que, entre nós, mais uma vez se perfila, no dealbar de mais uma campanha eleitoral, onde, entre outras se vai jogar uma arma muito eficaz: o medo.
Também o medo é abordado por Hans sobre o qual tece várias considerações e, para as ilustrar, conta um episódio pessoal.
Em 1975, estando de serviço num hospital sueco, entrou-lhe pela urgência dentro um piloto militar, a esvair-se em sangue e a falar russo. O medo inicial evoluiu, num ápice, para pânico. A Rússia tinha invadido a Suécia. A Terceira Guerra Mundial tinha começado! Felizmente a enfermeira-chefe chegou a tempo de o trazer à realidade. A vítima era um instruendo sueco cujo avião caíra no mar e por causa da hipotermia não conseguia articular corretamente as palavras. E o que lhe parecia uma hemorragia exagerada mais não era que um líquido vermelho que os coletes salva-vidas largam para sinalizarem a posição do náufrago, no caso de queda no oceano.
Se o medo pode transformar um piloto aprendiz num feroz combatente, se devidamente explorado, igualmente faz de um mediano comentador televisivo de futebol, num promissor político nacional e poderá também transformar um medíocre gestor, num excelente Presidente de Câmara. Cabe-nos fazer de enfermeira-chefe, desmascarar os riscos imaginários, explicar a realidade e desmistificar os perigosos cenários que só existem na mente de quem nos quer vender gato por lebre. Numa palavra, é preciso enfrentar e combater o medo e desmascarar os seus promotores e divulgadores.

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