A opinião de ...

“Novos pobres, novas pobrezas”

São estas as palavras que me permito citar para servirem de título a esta crónica. Foram pronunciadas na homilia da eucaristia do domingo, dia 15 de agosto, por Senhor D. José Cordeiro, Bispo de Bragança e Miranda, a partir do santuário de Nossa Senhora da Assunção – no Cabeço, Vila Flor – envolvendo uma ideia-força sobre a qual pretendo fazer uma breve reflexão. Feliz designação esta de ‘Cabeço’, pois que, do alto, se vislumbra uma paisagem deslumbrante em 360 graus. Decerto que Jesus teria adorado passar por estes montes – Ele que subia à montanha (à colina) e dali falava do Reino de Deus – decerto uma forma de viver para o mundo e dar sentido à palavra divina. Quem por ali passar, pode, se for crente, acrescer à sua religiosidade, a beleza de montes e vales em redor, e, quem o não for, por certo, se deslumbrará e interrogará sobre a força telúrica das terras retratadas por Torga por este rincão transmontano.
Falou o Senhor Bispo de tantos “novos pobres” e de tantas “novas pobrezas”. E sinalizou, certeiramente, a necessidade de humanizar a humanidade. Pois bem, ocorreu-me voltar à imensidão de injustiças que grassam pelo Mundo, que têm aumentado: a fome, a doença, o analfabetismo, a diferença de género, a exploração de crianças sob diversas formas, as guerras e as estropiações e violações de meninas e adolescentes (vide Relatórios do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)1. Acrescem, como aliás o Senhor D. José Cordeiro refere, as correntes migratórias, com o consequente sofrimento de milhares, milhões, de seres humanos, em busca de um sítio para viver…
O Relatório do PNUD de 2020 aborda as questões de natureza climática e ambiental e suas repercussões nos mais pobres, tornando-os ainda mais frágeis, se possível é. Numa expressão forte, como alerta um alto funcionário deste Programa, Achim Steiner: “a humanidade está a travar uma guerra contra si própria”.
Em época de pandemia, surgem, oportunistas e populistas, as vozes clamando justiça em nome do Povo, conceito que não é especificado. Fala-se aos quatro ventos do Povo, sem lhe atribuir um conteúdo específico (há que ser honesto: ao longos dos séculos existiu uma certa ambiguidade semântica do conceito de Povo, como escreve António Bento em “Foi você que disse populismo?”, in Populismo e Democracia, edições 70, abril de 2021). Ora invocam a dor e o sofrimento, ora a capacidade de o Povo de resistir contra o que eles designam como elites, sendo eles próprios elites, utilizando linguagens apelativas, despidas, embora, de ações concretas. O que lhes interessa é lutar contra a democracia representativa, mas servindo-se dela, oportunisticamente. Esquecem os novos campos de detenção (Austrália – ilha de Manus), os novos muros da vergonha (Turquia) e as reações negativas de alguns países europeus face às migrações. O discurso populista tudo esquece – um claro interesse numa certa e desavergonhada ‘depuração’ da sociedade.

1 É fácil de consultar este Relatório, bastando, para quem tem net, seja num computador, seja num telemóvel mais atualizado. Ajuda-nos a ver como vai o Planeta e os Homens.

Edição
3848

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