Bragança

Lojas históricas resistem, persistem e continuam a destacar-se pela diferença

Publicado por GL em Qui, 2022-03-10 11:22

Já são poucas as lojas históricas que mantém as portas abertas na cidade de  Bragança, mas algumas resistem ao tempo, aos hipermercados, às vendas online, só graças à paixão dos proprietários pelo comércio. 

Há quase 50 anos que Avelino de Morais Martins abriu os Armazéns do Castelo em Bragança, mais concretamente na Rua dos Combatentes da Grande Guerra, antiga Rua Direita. “Aqui encontra-se de tudo”, garante Avelino, 92 anos,  dos quais 75 foram dedicados à atividade comercial.

E tudo o que é? “Panelas pequenas médias e grandes, algumas com 50 litros, louças, estanhos, plásticos, artigos de decoração, cobre, vidro, cristais, alumínio, inox. Enfim, praticamente tudo o que precisa uma casa, um restaurante ou hotel”, enumera Avelino que se reformou há 30 anos, mas nunca deixou de trabalhar. Move-o o gosto pelo que faz.  Como a cabeça "ainda está no lugar", frisa, até ocupa melhor o tempo. “A pensão nem chega a 300 euros. Tenho mesmo que trabalhar”, garante.

De qualquer modo, quem corre por gosto não cansa e Avelino gosta da loja, da rotina e de ter um dia preenchido. “Não sei fazer outra coisa. Cá andarei mais algum tempo e depois terei de fechar a porta porque é difícil passar este tipo de negócio”, explica.

Aprecia o contacto com o povo, enquanto vende troca dois dedos de conversa sobre a cidade e a atualidade. Recordar o passado fá-lo viajar no tempo. A lucidez que conserva permite-lhe pormenorizar factos. “Este comércio já existia quando eu vim do Ultramar, mas era um armazém de retém. Comprei isto e dediquei-me. Antes o meu ramo anterior  era pronto-a-vestir e caixeiro-viajante”,  recordou.

O negócio já não está nos alvores de outros tempos. “Há 30 anos, em 1990, cheguei a fazer 300 contos (1500 euros) por dia, ontem fiz 34 euros. Mudou tudo”, explica o comerciante que culpa a crise, que leva à falta de dinheiro, e a concorrência dos hipermercados como as grandes razões para o comércio tradicional faturar menos e viver dias complicados.   

São a qualidade e a diferença dos seus artigos que continuam a levar clientes aos Armazéns do Castelo. “Vendo para restaurantes, escolas, lares de idosos e a particulares. O meu artigo é diferente e isso ainda vende. Todos dias vendo panelas. Quando alguém quer uma panela grande, com 50 litros, vem aqui. Eu tenho. Ainda vendo das de ferro com três pernas”, garante.

A zona histórica, nomeadamente as ruas que descem da Praça da Sé em direção ao Largo dos Combatentes, estão paradas. Apesar de ter em recuperado alguns serviços públicos,  como a Direção de Finanças e o Regist Civil e Predial, a maioria das antigas lojas já fecharam as portas. “Está isto muito morto na zona. Nem sei como há casas abertas, com as rendas altas que pagam. Eu tenho uma renda baixa e não tenho empregados, mas antigamente tinha dois”, lamenta Avelino.
Apesar de a loja ter um aspeto antigo tem-se feito um esforço de modernização dos artigos para venda.  “Ainda tenho um ou outro cliente jovem. Quando precisam de comprar uma prenda vêm até cá”, ressalva.

Drogaria Luso tem 62 anos  e mantém o “ambiente familiar, que os clientes reconhecem pelos cheiro”

Desde 1960 que a Drogaria Luso é uma referência em Bragança, sendo atualmente a loja mais antiga da cidade.  

Conhecida por ser a  loja dos brinquedos, a única que existiu durante muitos anos, marcou gerações que quando  ali entram  continuam a sentir a nostalgia da infância. “A geração dos 40 e 50 anos lembra-se bem do meu pai e dos brinquedos que compravam na drogaria. Entram e dizem que o aroma – como tenho a drogaria - os transporta para a infância. Entram e passado bocado dizem que o olfato lhe traz as memórias. Dizem que tem o mesmo cheiro. O cheiro da infância. Para mim é uma alegria ouvir isso. Às vezes vêm cá e trazem os filhos e até os netos”, conta  Dalila Luso, a filha do fundador da drogaria e atual prprietária.

Dalila é uma comerciante orgulhosa deste património que herdou e que preserva ciosamente, mesmo que “não seja um negócio para enriquecer, mas para ir indo”, confessa.

“O comércio tradicional já deu dinheiro, agora é mais uma paixão e ir aguentando”, vincou a empresária.   As lojas históricas, que vendem produtos tradicionais, estão na moda, porém este ano de 2022 não teve um início auspicioso. “A coisa vai fraquita. Há algum receio de gastar dinheiro e ponderam-se mais os gastos. A crise já vinha da covid-19 e agora também há a guerra da Ucrânia. Nada ajuda”, explica Dalila que considera o valor elevado das rendas o maior obstáculo ao comércio tradicional. “É um orçamento mensal grande, mais as taxas e taxinhas que é preciso pagar ao Estado”, sublinhou.

Mesmo a lado, os Armazéns Gomes, do setor do têxtil lar e vestuário,  é uma loja mais recente, com cerca de 30 anos, mas o empresário  Paulo Gomes garante que conserva clientes de Bragança e de fora, até espanhóis. “Procuram produtos mais específicos que só eu tenho”, conta.

 

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