A opinião de ...

Aniversário

O Mensageiro celebra 75 anos de vida. No futuro o historiador plasmará provavelmente o seu devir escorado na matricialidade de onde emana. A celebração de uma existência cujas origens brotaram debaixo da tempestade autoritária dos ismos originadores de largas dezenas de milhões de mortos lá fora, cá dentro o espartilho derribava opiniões contrárias à ordem estabelecida, provocava dor e sofrimento, atingindo ilustres membros da Igreja que personifico no Padre Abel Varzim. Obviamente, inseria apologias ao Estado Novo. Vale a pena ler sem vesguice os números referentes aos primeiros anos a fim de formularmos ideia, camada a camada, até chegarmos ao caroço. Nessa época o fio condutor do jornal fincou-se colocando a ênfase no povo trazendo ao de cima os pesados problemas que carregava nos ombros, os quais resumo em: pouco pão, míseras estruturas, isolamento, ausência perspectivas a originarem massiva imigração, e emigração clandestina. Na altura o jornal cirandava lá em casa, assinatura de largas dezenas de anos do poder paternal, confesso à puridade ser seu medíocre leitor. No entanto, guardei o artigo intitulado «Assim morre uma cidade» escrito veemente do seu director o Dr. Videira Pires a propósito da transferência do Batalhão Caçadores 3. A cidade alargava a descida bem inclinável rumo à vulgaridade dentro da atmosfera vigente no reino circular. Na década de sessenta, o Mensageiro congrega jovens aprendizes ávidos de tudo, levando os esbirros da Legião a encetar manobras intimidatórias causadoras de angústias e medos aos mais directos intervenientes. Salvo melhor opinião, o Dr. sobrinho Alves e a pintora Graça Morais têm autoridade na matéria, ao contrário de mim, apenas participei em duas ou três reuniões. A causa radica-se no facto de o surrealismo ter levantado a ponta do véu porque durante quatro meses (até Março de 1962) amesendou na cidade o poeta António Barahona da Fonseca, aliás Muhammad Abdur Raschid, empenhado na itinerância cultural da Fundação Gulbenkian.
A afectiva ligação ao jornal iniciada na adolescência obrigava-me e obriga-me a reflectir sobre a doutrina editorial, a conceder maior ou menor importância às opiniões, atenção, sempre às notícias. De outrora retenho a elevada qualidade literária da generalidade dos correspondentes – peças notáveis – de acerba crítica ao poder passando incólumes aos olhos da censura, julgo eu residir a razão no facto de serem incapazes de entenderem o fulcral de cada escrito.
Avesso à louvaminha, as evocações não as considero um somatório de elogios, os agora trazidos à claridade são mais que merecidos, tivesse engenho e dava-lhe melhor luzimento; também na devida altura critiquei registos de toda a ordem, referindo factos propiciadores do desacordo envolvendo a forma, ainda mais o conteúdo.
Na essência, o que impele a escrever no Mensageiro é a pluralidade vigente. Atributo a merecer vivaz e constante elogio. Auto-elogio, convenhamos.
Parabéns Mensageiro. Feliz Ano Novo.
 
PS. Por inépcia minha esta crónica não foi enviada a tempo de sair na edição anterior. As minhas desculpas a todos.

Edição
3507

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