A opinião de ...

E agora?

Tremendos rugidos ressoam na paisagem social portuguesa. As caixas de ressonância só não penetram nas comunidades monásticas votadas ao silêncio. Não tenho conhecimento capaz de enunciar mesmo que modestamente a construção modular do silêncio do monaquismo egípcio que intuímos nos escritos de João Cassiano, muito menos sobre a alegria de todos quantos praticavam a disciplina da omissão da palavra a favor da prática do mutismo. Nos últimos dias tenho procurado perceber a voracidade palavrosa através de chamadas de atenção acerca das virtudes da contenção do falar dentro do cânone da cultura popular – o silêncio é de ouro, a palavra de prata – quem muito fala pouco acerta – o que me repreende das más línguas me defende –, três exemplos a corroborarem o afirmado. O vulcão do falatório vomita palavras incandescentes colocando em causa instituições basilares para o regime democrático, todos sabem tudo de tudo, o segredo é um arremedo risonho nas redacções, temos grande dificuldade em separar o trigo do joio de modo a nos tranquilizarmos na esfera da justiça já que em inúmeros casos se apresenta desprovida de venda. A lentidão ajuda ao alargamento da vesguice logo maniqueísta a toldar a confiança recíproca, ganha terreno a velha tese das conspirações cuja mão negra coloca as ordens na caixa do correio envolta em luva branca. Desassossegados comentamos o caso Sócrates. Conheci-o acidentalmente nos idos de 1087 no Piano Bar onde entrou na companhia de dois rapazes de Bragança que mo apresentaram. Ele tinha o pescoço protegido por uma camisola de gola alta à Ives Montand, talvez por isso apenas falou de trivialidades a não me deixarem nenhuma impressão, depois fui assistindo à sua impetuosa escalada em direcção ao pico do poder rodeado de cortesãos e alguns amigos. Também neste jornal o critiquei azedamente quando entendi ter cometido erros acrescidos de outros praticados com o seu beneplácito. Após a sua derrota iniciou-se o parlatório agora torrencial, temerário não soube recolher-se transformando o silêncio numa benéfica forma de atenção. Seria bom para ele acabar ilibado o que seria horrível para o sistema judicial. Neste processo as meias-tintas são indesejáveis, em termos de balanço o País já arrecadou maléfica imagem, daqui a anos a sentença final nos dirá qual o prejuízo final. Será sempre significativo pois a nódoa vai ficar inserida na nossa História. Da cela continuará a replicar agudamente, a meditação silenciosa não lhe quadra.

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3503

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