A opinião de ...

Póvoa Rica

Recebi convite para participar na Festa da Castanha a ocorrer em Vinhais, não o posso honrar absorvido em trabalho marcado, ficou a lembrança do terrunho onde fui feliz, a outrora Póvoa Rica. O apodo de rica povoação pode nos dias de hoje ser cousa esdrúxula, as causas da mudança de nome não cabem nesta crónica, mas em gente a riqueza durou séculos, o magro de recursos espalhou-a nas sete partidas, persistindo a saudade mitigada nas festas. Dou um exemplo: em 1864, o concelho de Vinhais era o segundo no tocante a população, 19.928 habitantes, o censo de 1960, registava 26.577 indivíduos a ali viverem. E agora? O que aconteceu? As interrogações estão respondidas desde há muito, a forçada diáspora iniciou-se há séculos, teimosia de D. Manuel levou ao êxodo dos judeus, as confluências vesgas de centenas de governantes fizeram o resto. Isto é: as aldeias despovoarem-se, ficar significava miséria, doença, morte antecipada. Pouco dado ao sentimentalismo serôdio, a pieguices, procuro perceber as fundas causas da inércia que nos levou a entrar no Universo em vez de o tentarmos revirar na casa onde nascemos ou vivemos. Homens de acção, pioneiros no Brasil e em África, trabalhadores na Alemanha e em França até ao limite da sanidade, sacerdotes de topo, feros na defesa das suas convicções, marinheiros e militares ilustres, muitos altamente condecorados porque derramaram o seu sangue pela Pátria, cientistas de relevo, pontilham no firmamento estelar do concelho. E as mulheres? Heroínas, viúvas de vivos, amanhando as courelas com os filhos agarrados às vestes, cevando o mealheiro da casa, enxotando os avanços dos usurários cobiçosos do seu corpo e das melhores terras do forçado emigrante. E, na casa fumarenta, tecendo qual Penélope à espera da carta ou do milagre da reentrada do seu homem, educando os meninos, pedindo a Deus melhor sorte para eles, pelo menos tirá-los do lodo invernal. Está por fazer a história destas mães coragem, dos destemidos exploradores de sertões, dos pequenos comerciantes instalados no mato, dos rapazes que foram ao fim do mundo com um heroísmo admirável. Obrigados a partir continuam a deter os mesmos defeitos e qualidades desejando que os descendentes perpetuem as virtudes herdadas dos ancestrais. As castanhas foram pão até à chegada da batata e do milho maís, além de emblemática continua ser valiosa economicamente, conviria congregarmos esforços no desejo realizador de Vinhais voltar a ser Póvoa Rica. É pedir muito?

Edição
3494

Assinaturas MDB