A opinião de ...

A revolta dos velhos

 
Mesmo os distraídos, mesmo os iludidos, mesmo os desprevenidos já perceberam estar em curso violenta campanha contra os velhos e desempregados com mais de cinquenta anos. Tem duas faces, cada uma provida de aguçada lâmina de forma a retouçarem alegremente nos donos de cãs e calvas reluzentes, bons currículos profissionais construídos através do estudo e da experiência, também de maleitas e atrofias físicas. Vão frequentemente ao médico da Caixa, soltam exclamações às vezes lamurientas, queixam-se, antigamente era melhor, até porque havia muitas crianças a alegrarem as ruas e a encherem as escolas. Os velhos só dão despesa rumina-se nas esferas do poder, trabalhos e ocupação de tempo explodem os filhos e netos, um estorvo, autênticos potes de pés quebrados estridulam os novatos. Os idosos estão tramados, a expressão não é pouco canónica, as possíveis a substituí-la não as posso escrever. Os tratados antigos referem fórmulas usadas contra os velhos desde sempre: manta e gamela e ala para o monte, um inocente estragou a usança, outras vieram para ficar, Foucalt entre outros explica o modo como os velhos, loucos, estropiados e pedintes ambulantes eram tratados, ali, acolá, aqui. Leia-se a doutrina de Pina Manique sobre o tratamento a aplicar a mendigos e vagabundos. Ora, sendo assim e não havendo esperanças de melhoras a nível dos poderes, mais a mais, os émulos de Frei Miguel de Contreiras não são levados a sério, aos velhos só lhes resta um recurso: revoltarem-se. Não violentamente, através do uso da inteligência, que a larga maioria ainda detém. A solução está na massiva inscrição nos partidos da simpatia de cada um, desde que sejam do arco do poder, é moda dizer-se assim. Inscritos nos partidos têm de frequentar os plenários, serem militantes que militam a sério, fazendo inflectir a linha de rumo a seu favor. Sendo mais do que os jovens, possuindo saberes condensados na argúcia da razão como Hegel escreveu, num ápice tomam conta das concelhias partidárias, das distritais enquanto existirem, não se justificam, daí para a frente escolhem os candidatos a todos os cargos, passam a usar o poder a seu favor. Utópico? Não senhor; se os velhos quiserem é exequível à vista desarmada. Massivos no número, maciços no querer, tomam as rédeas do Estado, governam com bom senso e bom gosto: os jovens aprendem a valia dos mestres dos que sabem, por serem novos sabem pouco. Vamos a isso. Eu tenho ido. Não temos nada a perder, só a ganhar.

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3482

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