A opinião de ...

Regresso às aulas

Com a aproximação do outono acaba também o período de férias escolares.
Por todo o lado, a azáfama própria do regresso às aulas toma conta das famílias.
Ajustam-se novamente as rotinas para organizar o dia em função dos horários escolares dos filhos, bem como para incluir as suas atividades extracurriculares, se for esse o caso.
Para aqueles que vão continuar o seu percurso educativo noutra localidade, as dificuldades são acrescidas, já que implicam, além do mais, a adaptação a outra cidade, a colegas e professores novos e a um superior grau de exigência académica. Além disso, as famílias respetivas são ainda chamadas a resolver outro problema, que é o alojamento para os estudantes deslocados.
Infelizmente, esse continua a ser um dos fatores que mais discrimina negativamente os estudantes de agregados familiares com rendimentos mais modestos, uma vez que, ao custo das propinas, acresce ainda o preço do alojamento, particularmente elevado nas principais cidades.
De resto, apesar dos progressos registados, a ação social escolar continua a ser insuficiente para superar esta desvantagem, sobretudo no que toca à questão do alojamento, levando a que continue a haver desistências do ensino superior por motivos económicos, apesar da injustiça gritante e do desperdício de recursos humanos que isso representa.
Por outro lado, para os pais e mães dos estudantes que partem para estudar noutra cidade, é também um momento delicado em que são confrontados com o novo vazio que se abre no seu lar, especialmente quando não têm mais filhos em casa.
Nessa nova etapa, misturam-se sentimentos de orgulho e entusiasmo pelo percurso educativo dos filhos e o futuro que se lhes abre, mas também apreensão pelo que este lhes reserva.
Além do mais, é também um momento de questionamento relativamente à educação que se deu aos filhos, nomeadamente no que respeita à sua preparação para a vida independente, longe da asa protetora dos seus pais.
Efetivamente, no nosso tempo e na nossa cultura, fruto de circunstâncias diversas, nomeadamente da (sobre) representação do perigo e, para alguns, de uma memória de certo abandono na infância, própria de outros contextos, foi-se adotando uma forma demasiado protetora em relação aos jovens, limitando o processo de crescente autonomização que é suposto a educação conferir.
Na verdade, educar é basicamente habilitar as novas gerações para a vida independente, dando-lhes as ferramentas intelectuais, emocionais e motrizes que lhes permitam expressar no mundo a sua ação transformadora.
Nesse sentido, é uma dádiva que os pais entregam aos filhos, de forma desejavelmente desprendida, pese embora o temor à solidão que todos enfrentamos à medida que o tempo passa e vamos envelhecendo.
Ainda assim, quando os vemos partir, fica a sensação de que haveria ainda mais um conselho a dar, como se a nossa experiência pudesse servir para lhes evitar passar por situações de sofrimento, apesar de corrermos o risco de estar a projetar para eles a nossa própria problemática interna.
Com essa consciência, se fosse esse o caso, eu selecionaria estas frases para dizer ao meu filho deslocado, citando Silo:
“Todo o mundo a que aspiras, toda a justiça que reclamas, todo o amor que procuras, todo o ser humano que gostarias de seguir ou destruir, também estão em ti. Tudo o que mude em ti, mudará a tua orientação na paisagem em que vives. De modo que se necessitas de algo novo, deverás superar o antigo que domina no teu interior. E como farás isto? Começarás por te dares conta de que, ainda que mudes de lugar, levas contigo a tua paisagem interna” (in Humanizar a Terra: A Paisagem Interna, Cap. IV, www.silo.net).

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