As eleições
Anda no ar a grande campanha para as legislativas. Já se ouvem autoelogios, já se ouvem diatribes contra o “adversário”.
O que para uns foram boas decisões, (e assim deverá continuar para bem dos portugueses), para outros foram más decisões e, por isso, é imperativo que haja uma mudança de governantes do País.
Argumentam uns que, perante uma herança de desgraça, houve necessidade de muitos sacrifícios dos Portugueses e de uma inflexível determinação para se cumprir o que fora acordado com os credores, fazendo crer que, havendo mudança destes bem-intencionados governantes, vai correr-se o risco de se tornarem inúteis esses muitos sacrifícios, pois que estamos no bom caminho e que o pior já passou. Argumentam os outros que os sacrifícios foram enormes e que deveriam ter sido aliviados para bem da economia, do crescimento, do emprego e, consequentemente, para o bem-estar dos Portugueses.
Dizem ainda estes que, por tais sacrifícios, há muita gente na miséria, com falta dos mais elementares recursos, que há crianças com fome e que, se não fosse a solidariedade do nosso povo, tal seria a situação que muita gente morreria de inanição, enquanto ficaria sem teto, sujeita a todo o rigor do clima. Contra-argumentam aqueles, desvalorizando a situação, desvalorizando também a que, nos últimos quatro anos, foi a maciça emigração, só comparável à dos anos cinquenta e sessenta, enquanto os outros sublinham a enorme falta que tanta gente faz ao País, a maioria qualificada, que se viu forçada a emigrar.
Em relação à saúde, há também opiniões díspares: para uns tudo está controlado e a funcionar bem, com algumas falhas pontuais, facilmente colmatadas; para outros é evidente que não, tanto pela falta de pessoal nos mais variados serviços, como pelo espaço oferecido pelas unidades de saúde.
Quanto à educação, as opiniões também divergem: dum lado uns apontam metas a atingir, impõem regras a cumprir, acham que tudo está a correr bem e que, tirando um ou outro problema pontual, que de imediato desvalorizam, o ensino vai-se manifestando com êxito nas condições requeridas e com as verbas adequadas, enquanto são comparados os ensinos – público e privado – e elaboradas listas de rankings das escolas, sem terem em conta os mais elementares critérios de classificação.
Por outro lado, há os que entendem que a educação sofre de falta de meios para um bom exercício, o qual conduziria àqueles melhores resultados: são as verbas, os espaços onde ele se exerce, são as colocações atempadas dos que na escola têm a responsabilidade pelo bom êxito, quantas vezes sujeitos a uma carga horária que vai muito para além da legalmente estabelecida e se prolonga em casa até altas horas da noite, mesmo em fins-de-semana e feriados, sem qualquer contrapartida monetária ou em folgas.
A verdade é que alguém não nos diz a verdade, podendo levar o eleitor a acreditar naquilo que mais gosta de ouvir.
Permitam-me agora trazer aqui o comportamento do chefe de um partido que, acabado o seu mandato, se apresentou às novas eleições, numa localidade em que os maiores partidos ferozmente se digladiavam.
É Giovani Guareschi quem no-lo conta no seu livro “O Regresso de D. Camilo.”
Nesse comício, o tal chefe de partido, ao falar para a multidão, adotou uma atitude de humildade e de arrependimento por algumas práticas menos boas que tivesse feito enquanto exerceu o poder.
Nesta atitude, entre outras manifestações, não se autoelogiou nem se vangloriou do que foi feito por ele e pelos seus camaradas, afirmando também que não se aproveitou do cargo para enriquecer, mas que se apresentava às eleições sem qualquer interesse por um bom resultado, apenas para saber qual a apreciação que o povo iria fazer do seu mandato, enquanto reiterou a sua insuspeita convicção de que sempre teve “a intenção de procurar o bem” da sua terra.
Resta dizer que, com esta sua atitude, acabou por ganhar as eleições, não pensando os eleitores que, com este resultado, iriam passar mais uns anos sob a mão pesada do eleito de que tanto se haviam queixado