Diocese de Bragança-Miranda

O mundo precisa de uma “Igreja em saída” mais inclusiva

Publicado por GL em Qui, 2022-09-01 09:28

A Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) já divulgou o relatório de Portugal relativo ao Sínodo 2021/2023, onde se conclui que a Igreja é tida globalmente como uma instituição credível, presente nos locais onde ninguém ousa ir e solidária com os mais desfavorecidos, a quem presta assistência, mesmo quando falham todas as outras respostas sociais.
Segundo a síntese do documento de 10 páginas, a que o Mensageit teve acesso, o mundo precisa de uma “Igreja em saída”, que rejeite a divisão entre crentes e não crentes, que olhe para a humanidade e lhe ofereça mais do que uma doutrina ou uma estratégia, uma experiência de salvação, um “golpe de dom” que atenda ao grito da humanidade e da natureza.

De uma forma geral, salienta-se a capacidade de acolhimento da Igreja Católica, sobretudo no apoio à pobreza, capaz de providenciar um espaço para a vivência da fé, que seja propício e facilitador da oração, revelando-se como urgente que a Igreja concretize os caminhos apontados pelo Concilio Vaticano II e regresse à essência e à alegria do Evangelho, contando com o Espírito Santo para esta missão tão bela e tão responsável.

Na síntese resulta claro que todos querem uma Igreja renovada, mais amiga dos necessitados, mais santa e mais evangélica, que propicie o envolvimento de todos.

O método sinodal, iniciado em 2021, passou pelas várias dioceses do país, onde se apelou a que a participação se manifestasse maioritariamente através da criação de grupos de escuta e de diálogo, para assim se proporcionar uma melhor oportunidade aos diversos grupos de se escutarem uns aos outros, ao invés das plataformas online, apesar de estas permitirem amplificar a participação, particularmente das vozes que não foram ouvidas no passado.  

As conclusões apontam que o envolvimento e a recetividade dos participantes neste momento da Igreja local podem ser considerados satisfatórios, com a generalidade das opiniões a caracterizar a escuta sinodal como uma realidade indispensável em Igreja, reforçando a vontade por uma caminhada em conjunto de forma regular e sistemática, através da criação de grupos formais e informais de diálogo dentro da Igreja e desta com o mundo, em especial com as periferias.

Apesar da indiferença declarada por alguns leigos, devidamente sinalizada, a caminhada sinodal foi acolhida com entusiasmo e expetativa por outros, tendo representado uma grande oportunidade para alcançar e escutar as periferias e aprofundar a comunhão entre os membros da mesma comunidade, promovendo o encontro, o diálogo e a partilha. Foi sentida uma maior indiferença na população jovem, que se mostrou pouco confiante com o resultado do processo sinodal por acreditar que não serão implementadas mudanças na Igreja, ao ritmo e visibilidade que anseiam. Acresce que, nalguns casos, a fraca adesão ao desafio da sinodalidade.

Pede-se mudança

Ainda assim, são apontados vários aspetos negativos, que deixam antever a vontade de mudança.

Deu-se conta de uma Igreja espiritual e humanamente pouco inclusiva e acolhedora, discriminando quem não está integrado ou não vive de acordo com a moral cristã, isto é, divorciados, recasados e pessoas com diferentes orientações sexuais, identidades e expressões de género (grupo LGBTQi+), que coloca em segundo plano as pessoas com deficiência, os mais pobres, os marginalizados e, consequentemente, desprotegidos, privilegiando atitudes assistencialistas nas situações de pobreza e institucionalização nos grupos mais vulneráveis.

Está em jogo não um processo de conversão em massa, mas a conversão de cada coração em ordem a um futuro melhor. Por isso se pede uma Igreja mais Santa e mais Missionária, a viver mais ao ritmo do Evangelho, mais serva humilde, imitando Jesus, o Bom Pastor e o Bom Samaritano.
Entre os aspetos menos favoráveis aponta-se vários:
Uma Igreja que tem dificuldade em fazer caminho com os jovens.

Uma Igreja com uma atitude demasiado hierárquica, clerical, corporativa, pouco transparente, estagnada e resistente à mudança, que prioriza a manutenção da sua imagem ao invés de preservar a segurança da sua comunidade, surgindo os casos de pedofilia como o exemplo mais evidente;

Uma Igreja que apresenta uma atitude algo soberba e que se mostra pouco disponível para a escuta, marginalizando os anseios e as expectativas dos membros da sua comunidade, atribuindo-lhes, demasiadas vezes, um papel de recetores passivos;

Uma Igreja em declínio social no que respeita à sua reputação e relevância, que não tem sabido utilizar a força transformadora do Evangelho numa oportunidade de conversão social, valorizando uma cultura humanista capaz de fazer o contraponto ao globalismo, que amarra os pobres e sedimenta as desigualdades e o localismo que gera xenofobia e promove populismos;

Uma Igreja pouco disponível para discutir de forma aberta e descomplexada a possibilidade de tornar opcional o celibato dos sacerdotes e a ordenação de homens casados e das mulheres, e ainda muito presa a um modelo teórica e doutrinalmente assente numa conceção tradicional e assimétrica que concebe o humano a partir do masculino;
Uma Igreja que não considera as mulheres em igualdade com os homens na missão, sendo ambos batizados e, portanto, discípulos, e que é pouco aberta à atualização dos rituais e da linguagem litúrgica, muito fechada e codificada, que tornam as celebrações pesadas e demasiado formais;

Uma Igreja onde os processos de tomada de decisão e escolha de lideranças é pouco transparente e inclusivo, restringindo a Igreja ao corpo composto pelo sacerdote e os leigos que desempenham uma função nos grupos paroquiais/movimentos eclesiais;

Uma Igreja que não fomenta os níveis aceitáveis de formação dos vários agentes pastorais, com destaque para os sacerdotes, que apresentam uma formação deficiente quer para lidar com os problemas humanos da vida contemporânea, quer para trabalhar com os leigos, que exigem trabalho em equipa, corresponsável e de partilha de autoridade.

Por outro lado, segundo o documento os ministros ordenados não têm formação adequada para responder a questões emergentes, como as que resultam da diversidade de género, o que dificulta um verdadeiro acolhimento de pessoas com orientações sexuais diferentes e que devem merecer atenção pastoral.

Refere-se que é uma Igreja que ainda não consegue formar os seus presbíteros através da via da beleza e da cultura, tornando-os homens do seu mundo e do seu tempo, com uma dimensão humana, espiritual e social, que lhes possibilite entender e interagir com a sociedade de forma credível, madura e relevante;

Uma Igreja que não se adapta aos ritmos e às exigências da família de hoje, na sua ampla variedade, desde as questões relacionadas com a vivência da sexualidade conjugal aos novos ritmos das famílias, sobretudo as que têm filhos;

Uma Igreja pouco atenta aos ritmos e desafios da sociedade, até do ponto de vista funcional, revelando horários de funcionamento desajustados, sobrepostos e pouco convidativos a uma verdadeira participação. Destacam-se os templos fechados, horários de missas sobrepostos e atividades simultâneas dentro da mesma comunidade, impedindo a participação de todos mesmo quando ela é desejada;

Uma Igreja que tem na sua principal expressão pastoral – a catequese – vícios e desencontros que inviabilizam a evangelização, sendo notória a dissociação entre o que é ensinado e o que é praticado: pais, alunos e até catequistas, que depois não vivem a sua fé de forma comunitária e não experimentam o verdadeiro encontro com Deus, ficando-se o momento da catequese como um prolongamento da escola, onde se aprendem conteúdos religiosos mas não se promove o verdadeiro encontro com Jesus;
Uma Igreja que se debate com problemas financeiros, que embora pouco valorizados pela esmagadora maioria das dioceses;

Uma Igreja que concentra de forma excessiva no sacerdote diversas funções, que o impedem de cuidar da sua missão pastoral, na dimensão que a comunidade o exige. Refere-se também que é importante libertar os párocos de trabalho burocrático.

No que respeita à formação, é importante também que haja uma maior exigência e continuidade na formação em várias dimensões, tanto dos sacerdotes como dos leigos. Uma formação teológica, bíblica, humana, para o exercício dos ministérios litúrgicos, sacramentais e presbiterais, e para o diálogo com a sociedade e a cultura.
Nesta vertente formativa, apresenta-se como essencial a reestruturação do caminho formativo dos seminários, que exibe lacunas na dimensão humana, espiritual, afetiva e cultural, devendo enquadrar-se nos desafios e exigências do nosso tempo.

Foi também manifestada a importância da necessidade de reflexão sobre o celibato sacerdotal, propondo que o mesmo seja opcional; sobre a valorização do papel da mulher num plano de igualdade com o homem, incorporando-a nas estruturas do poder eclesial e sobre a harmonização de critérios e regras comuns para a pastoral e sacramentos, uniformizando as respostas de cada paróquia, transformando-a, assim, numa casa de todos, lugar onde o amor e a misericórdia sejam o pão nosso de cada dia.

O envolvimento e a recetividade dos participantes neste momento da Igreja local podem ser considerados satisfatórios, com a generalidade das opiniões a caracterizar a escuta sinodal como uma realidade indispensável em Igreja, reforçando a vontade por uma caminhada em conjunto de forma regular e sistemática, através da criação de grupos formais e informais de diálogo dentro da Igreja e desta com o mundo, em especial com as periferias.

Apesar da indiferença declarada por alguns leigos, devidamente sinalizada, a caminhada sinodal foi acolhida com entusiasmo e expetativa por outros, tendo representado uma grande oportunidade para alcançar e escutar as periferias e aprofundar a comunhão entre os membros da mesma comunidade, promovendo o encontro, o diálogo e a partilha.
Foi sentida uma maior indiferença na população jovem, que se mostrou pouco confiante com o resultado do processo sinodal por acreditar que não serão implementadas mudanças na Igreja, ao ritmo e visibilidade que anseiam. Acresce que, nalguns casos, a fraca adesão ao desafio da sinodalidade foi interpretado como uma atitude de resistência, sobretudo por parte do clero, ou de alheamento à dimensão universal abraçada pela Igreja.

A CEP deu conta que fará a apresentação pública do documento, “em momento oportuno, de acordo com o que o Conselho Permanente decidir na reunião de setembro, tendo em conta também o início da fase continental, que será anunciada pela Secretaria- Geral do Sínodo dos Bispos”.

Sublinha-se ainda a importância de “consolidar a consciência sinodal”, continuando “a dinâmica de caminhada conjunta, com linhas pastorais programáticas suscitadas pela Conferência Episcopal Portuguesa para toda a Igreja em Portugal”, a partir de uma “escuta das dioceses, que, por sua vez, escutam as suas comunidades, refletindo e concretizando as propostas de mudança apresentadas”.

O processo para a celebração do Sínodo, convocado pelo Papa Francisco, está dividido em três fases está dividido em três fases, entre outubro de 2021 e outubro de 2023, passando por uma fase diocesana e outra continental, que dará vida a dois instrumentos de trabalho diferentes distintos, antes da fase definitiva, ao nível mundial.

Nota de Redação: Este texto foi escrito com base na síntese  sinodal da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), um documento de 10 páginas.  

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