A opinião de ...

A AMNISTIA PELO SILÊNCIO

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos foi uma inovação que, pela primeira vez, deu aos cidadãos dos Estados aderentes o direito de recorrer para uma instância transnacional, mesmo contra decisões do seu Estado de pertença. Era um evidente condicionamento da soberania como é classicamente entendida, mas filiava-se na “justiça natural” que tem inspirado as Declarações de Direitos Humanos, como a da ONU, e antes da americana e da francesa. O conselho da Europa, entidade que incorpora o Tribunal, sancionou em 2014 a Rússia, pela sua política em relação à Ucrânia, como a imprensa internacional largamente comentou, sublinhando o rigor do fundamento e não omitindo o enfraquecimento do Conselho. Subitamente, quando se preparava a sessão parlamentar do Conselho, que se realizou em 24 de junho, o Parlamento Russo informou que a sua delegação estaria presente em Strasbourg. A reação foi de júbilo pela chamada reintegração, que não assentou em qualquer reparação da causa da exclusão, ou decisão de amnistia, mas simples pelo silenciamento coberto pelo jubilo. Designadamente o Le Monde de 24 de junho, sublinhava que “se Moscovo saísse da Instituição, os cidadãos russos não mais teriam acesso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Mas infelizmente teve de não omitir que, se o benefício abrangia 144 milhões de cidadãos russos, o Tribunal, em vinte anos, tinha recebido mais de 160.000 recursos desses cidadãos, mas Moscovo “se conforma raramente com as sentenças”. Não deixa de ser preocupante que entre vários parlamentares, o motivo dominante é o receio das consequências de uma rutura com a Rússia, acrescentando o risco de tal rutura contagiar a Turquia ou o Azerbaidjan, frequentemente criticados pela displicência em relação aos Direitos Humanos. O facto mais semelhante ao temido contágio, passa-se com o governo dos EUA, a pátria da Primeira Declaração de Direitos de Jefferson, ele próprio crítico da omissão dessas declarações nas constituições democráticas, e seguramente de governantes que não tenham lido a de Virgínia de 1776. Acontece que a criminalidade da última Guerra Mundial (1939-1945), sobretudo a praticada pelo regime nazi, implicou, em nome da justiça natural, que o Tribunal de Nuremberg fosse dotado de uma “lei retroativa” para julgar os responsáveis governantes e militares, a maioria dos quais foram condenados à morte e executados. Organizada a nova paz, cujos princípios foram consagrados pela Carta da ONU, foi instituído um Tribunal Penal Internacional que tem a competência de julgar os crimes de guerra, que não deixaram de ser praticados depois da prometida e ambicionada paz no “mundo único”. Recentemente este Tribunal publicou uma decisão no sentido de que não indagará quaisquer crimes de guerra porque não conseguiu a cooperação de nenhum Estado. O Presidente Trump festejou a decisão como uma vitória.

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