A opinião de ...

O meu tributo ao Pe. Videira Pires

O Pe. Francisco Videira Pires foi um sacerdote desta diocese que dirigiu o Mensageiro de Bragança durante três anos, desde o início de 1958 ao final de 1961. Foi um período áureo desta publicação. O jornal ficou conhecido pela sua elevada qualidade literária e gráfica. O seu diretor cultivou o debate de ideias, obtendo reconhecimento nacional.
No passado dia 21 de maio, o Pe. Francisco Videira Pires, se fosse vivo, completaria 100 anos. Morreu aos 83 anos, a 26 de agosto de 2002, quando ia celebrar a eucaristia na festa de Meles, concelho de Macedo de Cavaleiros, em substituição do Pe. António Rodrigues, que tinha falecido na véspera.
Era natural de Torre de D. Chama, concelho de Mirandela, a minha primeira paróquia. Regressou à sua terra natal depois de uma vida dedicada ao ensino, quando se jubilou como professor catedrático da Universidade da Beira Interior. Continuou a ensinar, primeiro no Instituto Politécnico de Bragança e, finalmente, no ISLA desta cidade.
Apesar de ser um académico destacado e reconhecido costumava dizer: “A professor qualquer burro com estudos chega. A minha maior glória é ser cristão! O batismo é a maior graça que recebi. Depois, o sacerdócio”.
Quando decidiu voltar à sua terra recebi essa sua intenção com alguma apreensão. O cónego Silvério Pires, Vigário Judicial desta diocese, cita muitas vezes o Pe. Fernando José Alves, natural da Fradizela, Mirandela, onde foi pároco durante 52 anos. O “meu Senhor Tio”, como costuma referir-se a ele, dizia: “Deus nos livre de paróquias com três cês: capelas, casacas e colegas”. E explica o cónego Silvério que “as capelas, quantas mais houver, mais dividem a comunidade – ao invés, a Matriz une. As casacas são a nobreza que já lá vai; contudo, muitos ainda suspiram por esses tempos... Quanto aos colegas, compreende-se: dois galos no mesmo poleiro...”
Na verdade, a minha preocupação foi infundada: o Pe. Videira Pires nunca me causou qualquer problema. Pelo contrário, resolveu-me muitos. Quando eu comentava com ele algo que me desagradava na comunidade, logo me dizia: “Não fale nisso, deixe estar. Quando for eu a celebrar, eu chamo a atenção à gente da minha terra”. Era um homem superior, de uma delicadeza fora de série – a forma como respeitava o pároco só o engrandecia.
Recordo a sua reação à remoção de dois altares da igreja – o do Sagrado Coração de Jesus e o da Senhora de Fátima – que tapavam duas janelas monumentais que, por isso, mereciam ser desimpedidas. Ele disse-me que o primeiro altar tinha sido colocado pelo Pe. Videira – seu tio e meu antecessor – e o segundo graças ao empenhamento da sua “querida mãezinha”.
Ninguém na Torre tinha mais razões do que ele para ficar sentido com a decisão tomada. Contudo, racionalmente – até porque em tempos tinha sido diretor do Secretariado de Arte Sacra da diocese – sabia que eu tinha feito o que devia ser feito. E se alguém me criticava pela decisão tomada, lá estava ele para me defender.
Desde o primeiro dia sempre se disponibilizou para me ajudar e ir às aldeias mais recônditas. Apesar da diferença de idade e de mentalidade, ele foi para mim um verdadeiro irmão no sacerdócio. Um homem notável com quem tive o privilégio de conviver e muito aprender.

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