Avós sobrecarregados?!...
Súmula expositiva de estudo frescamente levado a cabo mereceu à respectiva autora a titulação de que a «ausência de políticas de apoio à família sobrecarrega avós». Ora, não me alinho com tal asserção, na justa medida, e por experiência o afirmo, em que, na ausência de tais políticas ou na sua constância, jamais os netos podem sobrecarregar os avós. Porque o amor trabalhado na relação entre uns e outros tudo sobreleva e ultrapassa. Ao invés, instalam-se e reforçam-se mútuo crescimento e prazer, mais sentidos que descritos. A investigadora responsável pelo trabalho joga evidências incapazes de nos escaparem, relevando um desempenho feito imprescindível hoje em dia, com muitos anciãos arrostados com custos acrescidos que tornam ainda mais magros os rendimentos já encolhidos. E esse não equivale a um papel “invisível”, como afirma. Todavia, e ainda assim, a sobrecarga é condimentada com afecto desmedido, e a alegria de levar aos mais pequenos o que de melhor temos e sabemos facilmente arreda aquela, neutralizada. Pergunte-se a um avô ou a uma avó se prescindir de algo que mais pudesse estimar em favor do bem-estar de um neto, no mais importante que este encerra, pode, alguma vez, transformar-se-lhe em sobrecarga... Por outro lado, poderão os avós ser «um Estado Social paralelo», mas jamais subterrâneo ou clandestino. Os horários escolares não se ajustam às exigências do mercado de trabalho, e ainda bem. Se o fizessem, a permanência das crianças nas instituições educativas, em actividades lectivas e outras, tornar-se-lhes-ia ainda mais extenuante, ela que já ultrapassa os limites razoáveis das suas capacidades. Elas necessitam, absolutamente, de brincar, de tempos para si, e os tempos das crianças não são os tempos dos adultos. Não passa de violência sobre elas impôr-lhes horas a fio em espaços que acabarão por lhes proporcionar desprazer, numa reversão clara dos efeitos perseguidos pelos pais. E quando a escola pública não dispõe de mais tempo para armazenar as crianças, procuram-se privadas que o façam, ou outros espaços onde sejam acolhidas para matarem o seu tempo. Algumas voltam à escola mesmo em tempo de paragem de actividades, como se o ano escolar não lhes fosse já suficientemente prolongado, cansativo, fastidioso, tantas vezes. Por isso é que, «entre o ATL e a casa dos avós, não hesitam, ganha sempre a casa dos avós». Clarividente, pois, a subida importância dos avós enquanto prestadores de cuidados, educadores, entretanto, que as crianças não regateiam; antes apreciam. «Brinco e faço mais coisas com os meus netos do que fazia com as minhas filhas»; também eu, e simplifica-se a explicação: maior disponibilidade, mais paciência, amadurecimento realizado. E «o avô não os põe de castigo nem bate». Bem, alguns batem: «... e tem força, a velhota!...».
Em boa verdade, a ninguém pode passar desapercebido o papel crucial que os avós estão a levar por diante nos cuidados, atenções e formação dos netos, alguns a sua verdadeira e única âncora. Uma acção louvável a todos os títulos, materializada de forma directa umas vezes, indirecta outras tantas, quando os pais das crianças não dispõem do tempo que desejariam e de folgas materiais suficientes. Ao apoio moral que era comum os filhos receberem, prolongado no tempo de família constituída, acresceu a necessidade de outros mais, decorrentes da natureza e das voltas que as vidas deram.
Não vamos, porém e candidamente, acreditar que este cenário se repete sem excepções que, felizmente, confirmam a regra. Na realidade, nem todas as crianças usufruem dos privilégios em apreço, se bem que ao seu alcance imediato, todavia negados em favor de orgulhos de quem dependem. Se os avós de um lado demonstram disponibilidade absoluta para a dispensa de cuidados e atenções, indisponíveis se manifestam os da outra margem. E este embaraço conduz a incómodos branqueados com o atirar de crianças para instituições e actividades, longe dos braços e abraços que os próximos tinham à sua mercê, ternamente. Forma bizarra de tapar a indiferença e o comodismo dos que não querem, com o afastamento dos que queriam e podiam. E isto seria pouco se não se pretendesse, ainda e na mesma passada, fazer confundir, perversa e grosseiramente, a disposição e a prática de amor e carinho, atenções e cuidados, com interferências e intromissões de quem os colocou em abundância para fruição dos mais pequenos... E dos maiores (e que atenções!...)...