A opinião de ...

Bode Expiatório…

Existe um local, lá para o nosso Nordeste, o Transmontano, ali num emaranhado de estradas que se entrelaçam, vindas e indo para Macedo de Cavaleiros, Alfândega da Fé, Vila Flôr e Mirandela, é nó ancestral e com história. Não consta, pelo antigos, de ter vivido por aqueles sítios qualquer surdo conotado com a toponímia. Dizem os entendidos que a palavra foi-se adaptando aos tempos sendo de origem invasora mas com toda a certeza designando local de separações e origens, seria Marco/Meco, chegando até nós como Mouco, Cruzamento do Mouco, agora esventrado pelo IP2, numa das fraldas de Bornes. Dali mesmo agiganta-se o monte, elevando-se a 1200 metros até aos céus onde vivem os nevoeiros que metem medo. Esta serra de que vos falo, Bornes, outrora Serra de Monte Mel, situa-se no Centro-Este do Maciço Antigo, entre os Rios Sabor e Tua. A palavra Bornes designa “pedra que marca limite de território”, Mouco e Bornes ligam-se.
Passear por estas bandas, pelo fresco da madrugada, sentindo o acordar da natureza e o espreitar lento do sol, é dádiva divina ao alcance de quem quer, palmilhar os caminhos que esventram a serrania é gozo inesquecível pois que os locais de abismo, de contemplação, do perscrutar do longe, do longe que vem até nós, é a sublimação da mente. Lá bem no útero, na Fraga dos Corvos, os ares do cimo entram-nos até á alma, insuflam-nos o vigor que nos foge pois que ali, naquele promontório, é ninho do vácuo, do nada e do tudo, de nós com a solidão, do confronto do eu connosco.
Por estas bandas existem nativos a preservar, vistos a olho nu se munidos de paciência, observar os corsos, veados e javalis, deambulando em plena liberdade na procura da suculência que os alimenta, é matar o ócio que nos destrói. Estes animais, protegidos do bicho homem, formam grupos organizados, são gente de quatro patas, todo terreno, vivem em cercania, delimitados pois que, nas invernias geladas que por aqui abundam, procuram os parcos haveres comestíveis de quem os ampara.
Todos sabem, os daqui e os de fora, é uma lenda, que por esta serra serpenteia a cabrada do Ti Parreira, rainha das redondezas, cento e vinte tufos de um invejável cinza xistoso, que se encarrapitam, sem tremuras, na ceifa das verduras que se escondem. Os assobios e gritares cantados do pastor quando se encontra ao leme do comando, ecoam pelos montes e vales, informam o povo que lá em cima, nos picos, está no amanho o leite gerador do mais delicioso e artesanal queijo de cabra que as memórias guardam. O Bode, dono absoluto do harém, hoje caminha cabisbaixo, uma pala travadora tolhe-lhe a virilidade que faz dele figura lendária, um mito. Pois hoje mesmo, nestes preparos, a Guarda Republicana, informa o Ti Parreira que o Pilas, nomeada do Bode, está acusado da destruição da horta do Zeferino, será preso e presente a um Juiz.
De orelha em orelha, no cochichar dos segredos, corre em boca aberta que os protegidos do costume, corsos, veados e javalis, foram os autores da dizimação pois que a extensão era em demasia para uma só rês. No entanto, a Justiça omnipotente, cega e desacreditada, acusa apenas um em detrimento da matilha, mesmo que inocente e, soberba, como medida de coação sentenciou o Pilas a andar de pala durante um mês, como Bode Expiatório…

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